Não resta dúvida que o Velho Testamento é parte constitutiva da cultura ocidental. Para onde caminharemos enquanto civilização, talvez possa ser melhor clarificado se tivermos a lucidez de aprender com a tradição que ainda continua nos inspirando e desafiando.
Estamos na terceira década do século XXI, mas alguns acontecimentos e comportamentos nos levam a pensar que ainda vivemos no passado colonial, na sociedade patriarcal com todas as suas chagas e limitações.
A mentalidade de certas pessoas manifestadas nas redes sociais e em outros espaços evidenciam preconceitos, formas de racismo, machismo, xenofobia, misoginia, aporofobia e tantas outras enfermidades da estupidez humana que acreditávamos ter superado.
A falta de tolerância, o fundamentalismo religioso alienador, a idolatria fanática e cega a certas formas de vida estão se tornando uma rotina em plena “sociedade tecnológica”.
Diante deste cenário desolador nos perguntamos: por que essa regressão moral? O que deu de errado na sociedade que em pleno século XXI, repaginamos mentalidades e comportamentos que acreditávamos ter passado? Estamos regredindo a barbárie? A cultura letrada ainda tem algo a nos ensinar de humanidade?
Trabalho aqui com a hipótese que a instantaneidade da comunicação afastou as pessoas dos livros e produziu a incapacidade de pensar reflexivamente. Mesmo que hoje exista um certo entusiasmo com a cultura digital, facilitada pelas tecnologias e pela revolução da informática, os livros continuam sendo as grandes pilastras que marcaram a cultura ocidental em todos os aspectos e tem algo a ensinar ao nosso tempo.
Um olhar cuidadoso para estas obras monumentais nos possibilitam perceber que, mesmo sendo escritos em outros contextos, possibilitam entender melhor nossa civilização. No entanto, não podem ser descontextualizados e interpretados instrumentalmente para propósitos pelos quais foram escritos. Dentre os exemplos podemos citar um dos livros mais conhecidos.
A Bíblia é considerada pelo livro Guinness dos Recordes o livro mais lidos de todos os tempos com mais de 5 bilhões de cópias vendidas e distribuídas. Como todos sabem, Bíblia, derivada do latim e do grego, significa “livros” e é composta por duas grandes partes: o Velho Testamento e o Novo Testamento.
A formação histórica dos textos da Bíblia, principalmente do Antigo Testamento, é altamente complexa e controversa. Foi escrita quase toda em hebraico, com exceção de algumas passagens no Gênesis que foi escrita em aramaico.
Os cinco primeiros livros do Velho Testamento, também chamados de Pentateuco, são a pedra basilar da religião judaica. Tudo inicia com Abraão. Após obedecer ao chamado de Deus, Abraão, o patriarca da fé, saiu da sua terra e foi para Canaã, onde constitui sua família e gerou seus filhos Ismael (filho de Agar) e Isaac (filho de Sara). Deus colocou a prova Abraão e pediu que sacrificasse seu próprio filho Isaac no Monte Moriá (hoje Jerusalém).
Ao provar sua fidelidade, Deus prometeu a Abraão que teria uma grande nação, mais numerosa que as estrelas do céu. Isaac teve dois filhos: Isaú e Jacó (também chamado de Israel). Este último teve doze filhos. Um deles José foi vendido pelos próprios irmãos a uma caravana que passava em direção ao Egito. Depois de um tempo como servo, José passou a ter um lugar especial na corte do Foraó.
Devido a uma grande seca na região a família de Jacó (em torno de 70 pessoas) se mudou para o Egito. Os descendentes de Jacó por mais de 430 anos permaneceram no Egito. Neste tempo multiplicaram-se como as estrelas do céu e tornaram-se um povo numeroso e fortalecido, mas acabaram sendo escravizados. Moisés foi chamado por Deus para tirar seu povo da escravidão.
A saída do Egito na direção da terra prometida é longamente narrada no livro do Êxodo. É nessa passagem que ocorre a revelação mais direita feita pelo Deus judeu a Moisés no Monte Sinai. É no Sinai que Moisés recebeu as Tábuas da Lei (os 10 mandamentos) e por isso, ao longo dos séculos, foram sendo construídos sobre o monte à sua volta vários locais de culto e foram sendo acumulados tesouros de três grandes religiões: judaísmo, cristianismo e islamismo. É neste mesmo monte que o profeta Elias, século mais tarde vai buscar refúgio para fortalecer suas forças para enfrentar o rei Acab e sua esposa Jezabel,
Muitos séculos nos separam dos acontecimentos do Velho Testamento e das manifestações de Deus no monte Sinai. No entanto, ainda hoje certas interpretações destes acontecimentos podem ser compreendas tanto de forma fundamentalista quanto de forma revolucionária.
De qualquer forma, não resta dúvida que o Velho Testamento é parte constitutiva da cultura ocidental. Para onde caminharemos enquanto civilização, talvez possa ser melhor clarificado se tivermos a lucidez de aprender com a tradição que ainda continua nos inspirando e desafiando. No entanto, temos de ser vigilantes para não fazermos leituras apressadas e descontextualizadas da própria tradição que podem produzir crueldades em nome de Deus e da religião.
Não podemos esquecer que na tradição cristã, Deus é amor, compaixão, vida em abundância. Tal compreensão antagoniza não é compatível com discurso de ódio, violência e morte.
Sim, é difícil para nós humanos identificarmos o belo das árvores vestidos de arrogâncias e de conceitos estipulados pela sociedade mesquinha e que não é igualitária uma com as outras, criando guerras de intensa batalha entre o bem e o mal.
É com alegria que trago o nosso querido poeta Manoel de Barros com os seus neologismos e exercícios de ser nos versos em que nos diz:
“Senhor, ajudai-nos a construir a nossa casa / Com janelas de aurora e árvores no quintal – / Árvores que na primavera fiquem cobertas de flores / E ao crepúsculo fiquem cinzentas como a roupa dos pescadores.”
Sim, árvores belas não porque estão cobertas de flores, no que concerne a beleza exterior, mas na sua essência e ideia de bem e justa para com os que dela necessitam e as olham como se fossem pequenos investigadores a descobrirem pela primeira vez uma coisa que sempre esteve ali e nunca foi percebida.
Temos o costume de passar pelas árvores e ignorá-las porque não falam como nós, mas esquecemos que elas têm os seus próprios sentimentos e emoções. Ai de quem faz mal a uma árvore e ai de uma árvore que é machucada pelos “cegos” da beleza.
O mundo é belo e ponto final. Poderia dizer isso e não mais continuar a escrever, mas há particularidades na beleza do mundo. No que diz respeito a natureza, é verdade, tudo é belo e tudo se constitui de um segredo maravilhoso que cuida dessa beleza como quem cuida de um filho. Vale a pena contemplar a beleza da natureza só por alguns instantes do seu dia.
No caso da etimologia, a palavra “belo” vem do latim “bellus”, que significa “lindo, bonito, encantador”. Muito usado na época clássica apenas para mulheres e crianças, enquanto para os homens tinha sentido pejorativo e um ar apolíneo, de Apolo, o deus da beleza e da guerra.
Contudo, o termo, antes de sua definição latina, pode ter vindo também do indo-europeu DW-EYE, aproximando-o de outros termos, como bônus, de “bom”, e bene, de “bem”.
Nos dias atuais, o dicionário “Houaiss” da Língua Portuguesa define o belo como algo “que tem forma ou aparência agradável, perfeita, harmoniosa. Que desperta sentimentos de admiração, de grandeza, de nobreza, de prazer, de perfeição.” Ao longo do texto discutiremos mais esse conceito de belo com outros teóricos e filósofos.
E essas são as principais ideias que vêm à mente da maioria das pessoas em relação ao significado de beleza. Termos como beleza, estética, harmonia, proporção, equilíbrio entre outras, são vocabulário permanente no discurso e trabalho de muitos, inclusive os profissionais da indústria da moda.
Tire um tempo para estar entre o verde, de preferência, as árvores e olhe para elas não como quem olha apenas para ter a certeza de que algo existe, mas com a alma limpa e pronta para enxergar o belo dos troncos, das raízes, das folhas caídas no chão, dos galhos e dos seus frutos, o belo das árvores que estão nos roubando pouco a pouco com a chegada da tecnologia nas grandes cidades.
Experimente conhecer este belo das árvores que nos tranquiliza o espírito e nos acalma diante dos problemas do cotidiano.
Respire profundamente e deixe que o ar anime todos os órgãos do seu corpo. O belo das árvores é que elas sabem como ninguém nos amar sem nos pedir nada em troca, elas são humildes e solidárias às nossas necessidades de amor, cuidados, atenção e gratidão.
A estética das árvores é toda representação de belo que pode ser sentida através da audição, olfato, paladar e visão. Sendo um ramo da filosofia que estuda a beleza das coisas não poderia deixar de falar da estética das árvores uma vez que poucos ainda as olham com esse olhar curioso e resplandecente que identifica beleza e singularidade nos seus troncos grossos, nos seus galhos que se estendem pela terra e saem invadindo corpos externos do outro lado do muro que tenta impedir o crescimento da árvore, mas ela é maior do que o cimento e tijolo feitos pelo homem.
Os filósofos da Grécia antiga costumavam contemplar o belo nos seus jovens assim como podemos ver no diálogo platônico “Hípias Maior”. Hípias é um livro em diálogos que tem como objetivo a investigação sobre a natureza do belo. Este diálogo escrito por Platão, mas que tem como principal interlocutor e personagem o filósofo Sócrates, pretende através do princípio da dialética definir o belo em si. No entanto, o que se percebe é que essa possibilidade se frustra, pois um dos interlocutores, o sofista Hípias, procura estabelecer a questão do que é belo pelo particular e as questões sobre o belo desembocam em um relativismo e em aporias, até mesmo porque, Sócrates também não tinha uma teoria sistematizada como, muito depois, Aristóteles apresentará.
Considerado um dos grandes sábios da Grécia, Hípias tinha grande fama por onde passava. Ganhou popularidade e muito dinheiro, como era de praxe entre os sofistas. A cidade de Lacedemônia foi onde resolveu as questões mais importantes. “Hípias Maior” relata o debate entre Sócrates e um dos sábios mais bem pagos dentre os sofistas da antiguidade. Uma “luta” dialógica em torno da questão do belo.
A questão principal, o foco da discussão, é apresentada quando levantada a questão a Sócrates: “Mas como é que tu, Sócrates, distingues o que é belo do que é feio? Olha lá, saberás tu dizer-me o que é o belo?” Esta questão leva Sócrates à procura de um dos maiores sábios para desenvolver e definir o problema da beleza. É em Hípias que Sócrates buscará uma interlocução para tal questão.
A primeira definição apontada por Hípias é de que o belo é uma bela rapariga. Hípias não vê nessa definição nenhum problema, pois se tal definição fosse apresentada a uma assembleia não haveria objeção, pois toda gente pensa assim. No entanto, Sócrates rejeita tal definição, pois para ele a questão do belo não pode ser respaldada por uma questão de caráter particular.
Algo particular não pode ser belo. Para Sócrates uma coisa particular seria relativa. Por exemplo, uma bela rapariga é feia perante uma deusa ou “o mais belo macaco não passa de feio, comparado com a espécie humana”.
Uma segunda definição para Hípias é a de que o belo é o ouro. Mas novamente Sócrates refuta dizendo que a estátua da deusa de Atenas que foi esculpida por Fídias, portanto bela, é feita de marfim. Uma terceira definição é de que o belo é aquilo que é apropriado.
Mais uma vez o sofista é ridicularizado, neste momento aparece o exemplo da colher de madeira. O que seria mais conveniente, ou seja, apropriado para cozer um purê, uma colher de ouro ou uma colher de madeira? Sócrates demonstra que em se tratando de cozinhar um belo purê de legumes, a colher de madeira seria mais apropriada e, portanto, mais bela. Lembrando que para o sofista, o apropriado tem a ver com o aparecer, com o sensível. Sendo assim, o apropriado é o que faz parecer belo. Em todas as definições do belo apontada pelo sofista Hípias, o belo é perpassado pelo sensível.
Depois de todas as rejeições das definições sofísticas, Sócrates então parte para sua definição do belo.
O belo, afirma o filósofo, é aquilo que é útil, portanto o inútil é feio. O belo é aquilo que tem dýnamis, isto é, potencialidade. Nesta altura do diálogo de Sócrates, percebe-se que o belo se relaciona ao que é ético, pois é só quando a dýnamis é usada para o bem que se pode dizer que há o belo, logo o feio é a falta ou mal uso de dýnamis. O belo então é aquilo que pode ser entendido como vantajoso e proveitoso.
Como podemos ver sobre a diálogo de Hípias com Sócrates o belo é aquilo que pode ser entendido como vantajoso e proveitoso e então as nossas árvores podem ser consideradas com estas duas definições, pois além de nos serem vantajosas são por deveras proveitosas chegando a nos proporcionar momentos de êxtase e saída do mundo externo para o particular quando aproveitamos para descansarmos nossos corpos em seus troncos largados das nossas gravatas, sapatos de salto altos e batons. Ali experimentamos o que há de proveitoso nas nossas árvores.
Ao perceber as insuficiências dos conceitos elencados por Hípias, e após várias abstrações, Sócrates define o belo como aquilo que provoca prazer pela visão e audição. Ou seja, o belo é aquilo que é atravessado pelos sentidos, em especial, pela visão e audição. Portanto, se conhece o que é belo pelos sentidos. E, eles existem porque existem a música, a arte plástica, a arquitetura, etc.
No finalzinho do diálogo, no desfecho, o leitor é surpreendido e a questão não se resolve, pois nas palavras de Sócrates “o que é belo é difícil”. Sim, é difícil para nós humanos identificarmos o belo das árvores vestidos de arrogâncias e de conceitos estipulados pela sociedade mesquinha e que não é igualitária uma com as outras criando guerras de intensa batalha entre o bem e o mal.
Se comparamos as árvores como uma arte da natureza poderemos chegar próximos do conceito de belo mesmo sendo este difícil aos nossos olhos e sentidos, segundo Sócrates.
E se costumamos apreciar obras de artes com o olhar de quem critica e sabe diferenciar o feio do belo veremos nas árvores a mais perfeita definição de belo, pois assim como nós homens e mulheres elas são dotadas de partes que as constituem necessárias para o seu bem-viver quer sejam elas: raízes, tronco, galhos e folhas. Sendo cada uma dessas partes necessárias à vida da árvore.
A estética que procura enxergar o belo nas obras de artes caracteriza-se pelo olhar diferencial de cada homem que contempla o objeto a ser aclamado pela crítica valioso ou não dependendo da sua beleza. Sim, as árvores não vão à leilões. Não se compram árvores, pelo menos nunca vi. O que se pode comprar é o chão onde elas vivem e aí se ganha de presente uma delas.
Na essência e subjetividade das árvores, elas nunca terão um só dono, mas pertencerão à humanidade, aos deuses, aos animais que precisam delas para se alimentarem ou construírem as suas casas.
As árvores são o belo que se metamorfoseia todos os dias dependendo da estação do ano em outras linguagens que vão além dos nossos sentidos respondendo a indagação de Hípias com Sócrates que não é somente pelos sentidos que descobrimos o belo, mas também pela alma despida de todos os pré-conceitos que nos constituem o ser enquanto presente neste lugar de ódios e malvadezas.
Em “Hípias Maior”, Platão expõe as suas concepções estéticas sobre o belo e as artes, que, em “A República” (livro sobre política que demonstra um modelo utópico de cidade ideal), serão rechaçadas pelo filósofo e retiradas de seu modelo ideal de cidade.
O escritor italiano Umberto Eco fala o conceito de belo em seu livro “História da Beleza” e, lá, ele nos diz que o belo junto com gracioso, bonito ou sublime, maravilhoso, soberbo e expressões similares é um adjetivo que usamos frequentemente para indicar algo que nos agrada.
Assim sendo poderíamos dizer que aquilo que é bonito é igual àquilo que é bom e, de fato, em diversas épocas históricas criou-se um laço estreito entre o belo e o bom, como vimos pela própria origem da palavra.
As reflexões do autor sobre o belo ao longo da história nos convidam para uma viagem para além do entendimento entre beleza e bondade, como idealização de uma perfeição estética. Antes, abre caminhos para entendermos como o belo é importante nas relaçõesartísticas, sociais, políticas, religiosas, espirituais etc.
Como podemos constatar as coisas podem ser belas e boas ao mesmo tempo, logo as árvores são bonitas porque também são boas para nós. Elas nos dão frutos e sombras, embelezam as nossas casas e ruas, deixam o ar mais puro retirando dele toda a sujeira e alimentam os pássaros e outros animais. Logo, podem ser consideradas boas e se assim as são tendem a ser belas.
Quem olha para uma árvore com o olhar de uma criança vai enxergar nela muito mais beleza porque as coisas boas que podem ser encontradas ali são muito maiores do que o olhar de um adulto. Na verdade, as árvores são belas porque são criações da natureza que tudo o que faz é bom, justo e belo.
Sim, para ser belo algo tem que ser bom e justo. Não consideramos bonita uma pessoa que pratica maldades ou que agride outras pessoas inocentes e indefesas. O justo deve sempre ficar do lado do que praticou o bem, do que é certo, mesmo que este não seja o seu amigo.
Assim é a justiça, e com ela caminha também a ideia do bem que, numa sentença transitada em julgado, pode ser tida como ideia de belo se a pessoa acusada foi inocentada ou não, dependendo das provas e do pensamento do juiz.
Como podemos ver falar da estética das árvores nos leva a diversos caminhos investigativos. Primeiro nos compomos com as ideias já existentes dos filósofos e teóricos da antiguidade e da contemporaneidade para descobrirmos as nossas próprias ideias.
Uma vez imbuídos do nosso pensar, acreditamos que o belo está nas árvores assim como elas estão no belo. Não é à toa que elas estão nos desenhos da maioria das crianças e nas pinturas de diversos artistas assim como o pioneiro do impressionismo, Monet criou sua própria abordagem para a pintura de paisagens. Amante da natureza, inspirou-se em árvores e plantas ao longo de sua vida.
Não há dúvidas de que as árvores são belas e possuem uma estética própria. Com isso, podemos fotografá-las, pintá-las ou desenhá-las como se fossem deusas ou personagens que precisam ser imortalizados para guardarmos a ideia de bem não somente no nosso pensamento, mas nas diversas formas materiais onde elas podem ficar registradas.
Sendo esse belo das árvores o que as constituem nas mais complexas investigações a respeito das suas vivências e experiências de estarem sempre ali no mesmo lugar, no entanto terem conhecimentos e sapiências de mestres e doutores sobre o mundo através das suas raízes que se interconectam com outras e formam essa rede que troca conhecimentos e nos ajuda a identificarmos o segredo das suas relações íntimos com a Terra. Do chão vem o mundo que não podemos enxergar a olho “nu”.
Para finalizar, deixo vocês com o poema do meu querido poeta português Fernando Pessoa que nos diz:
“Segue o teu destino… Rega as tuas plantas; / Ama as tuas rosas. / O resto é a sombra de árvores alheias”.
Que nesta sombra de árvores alheias possamos enxergar o belo em tudo o que está nas árvores e as constituem não somente fisicamente, mas subjetivamente, naquilo que é impossível absorver sem o desejo de encontrar-se com o espetáculo da sua essência.
Diversos estudos e evidências reafirmam o descaso nacional para com a educação pública e a docência no Brasil. Precisamos reagir!
No Brasil, outubro é considerado o Mês Nacional da Ciência, Tecnologia e Inovação. Dia 15 de outubro é o Dia do Professor(a).
Em âmbito internacional, no dia 5 de outubro é celebrado o Dia Mundial dos Professores, o qual marca o aniversário da subscrição da recomendação da OIT/Unesco sobre o Estatuto dos Professores (1966). Este Estatuto mundial dos docentes foi atualizado em 1997 para incluir pesquisadores e professores do ensino superior.
Neste período, também, transcorre o processo eleitoral, pautado por acusações e ausência de projetos educacionais de interesse da população, especialmente dos jovens estudantes.
Diversos estudos e evidências reafirmam o descaso nacional para com a educação pública e a docência no Brasil. A maioria dos candidatos no processo eleitoral se restringiu a prometer uma educação profissional instrumental formadora de mão-de-obra para um mercado majoritariamente informal e com altos índices de desemprego.
Enquanto o descaso para com a ciência, a educação e a docência se agrava a cada ano, a maioria dos brasileiros assiste com relativa naturalidade.
O “apagão” docente expresso na falta de professores que já se faz sentir se agravará ainda mais; a queda de número de matrículas na educação básica é um paradoxo inaceitável e, o aumento de jovens sem emprego e sem continuar os estudos é um juvenicídio destas gerações.
Apagão docente
O Instituto Semesp divulgou estudo recente que aponta agravamento do “apagão” de professores o Brasil, ampliando a falta de professores que já atinge algumas áreas de conhecimento, como ciências da natureza e matemática. O país precisará de 1,97 milhão de professores em 2040, mas as projeções indicam que o total cairá 20,7% em 18 anos, gerando uma falta de 235 mil professores. E o cenário atual aponta redução do número de concluintes da graduação.
O percentual de formados em cursos de licenciatura apresentou um crescimento de apenas 4,3%, devido à alta evasão em Ensino a Distância (EaD), que ganhou destaque sobretudo a partir da pandemia de covid-19. A partir de 2020, a modalidade passou a representar 73,2% dos novos alunos, porém tem alto índice de abandono.
Queda do número de aspirantes a professor
Outra evidência é que o crescimento de ingressantes em licenciaturas, de 2010 a 2020, foi bem inferior ao crescimento registrado nos demais cursos. Em 10 anos, o número de calouros em licenciaturas cresceu 53,8%, porém, nos demais cursos, o índice foi de 76,0%. Entre os ingressantes com até 29 anos, houve um aumento de apenas 29,7% do corpo discente, enquanto nos demais cursos esse número chegou a 49,8% na mesma faixa etária. Ou seja, menos jovens querem exercer a docência.
A desvalorização da docência é estrutural ao trabalho docente na escola pública no Brasil: somam-se o baixo salário do professor; planos de carreira que não valorizam o professor; carga horária elevada, muitas vezes composta por várias matrículas; escolas sem infraestrutura para o ensino e, menos ainda, para a permanência no próprio ambiente para estudar, preparar aulas, participar de reuniões e outras atividades; e escasso material didático, desprestígio social e ameaças de gestores públicos e provados.
Queda das matrículas da educação básica
A falta de liderança do MEC juntos aos demais ententes da federação agrava a condição da educação básica no país. Sem políticas públicas e sem estratégias/programas de enfrentamento das consequências do covid-19, temos redução de matrículas na educação básica, bem como queda na aprendizagem de estudantes.
Dados preliminares do Censo Escolar da Educação Básica, divulgados recentemente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), já ajudam a traçar um panorama da evasão escolar no país e mostram, por exemplo, que o número de matrículas no Ensino Médio em 2022 foi 5,3% menor do que em 2021 – de 6,5 milhões para 6,2 milhões. No Ensino fundamental, em geral, também é registrada queda relevante no número de alunos.
Quanto as aprendizagens dos estudantes, as análises sobre o Ideb 2021 e o Saeb 2021 são divergentes. Uns apontam prejuízos e impactos irreversíveis e de longo prazo, enquanto outros criticam o exagero de algumas análises fatalistas. Para Daniel Cara, Coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, as “perdas de aprendizado ocorreram na pandemia de Covid-19, mas são menores do que o esperado e são reversíveis”.
Contra o catastrofismo na educação brasileira, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação se manifesta em nota no sentido de que esse é mais “um momento para valorizarmos a escola pública, sua função social e seu papel de educar o povo brasileiro.
A pandemia foi cruel com o mundo, especialmente com o Brasil – devido ao (des)governo Jair Bolsonaro. Há muito a ser feito, mas os resultados do Saeb 2021 e do Ideb 2021, devido ao trabalho das educadoras e dos educadores, anunciam: vamos vencer. Viva as professoras! Viva os professores!”.
Jovens sem trabalho e sem estudo
De acordo com o relatório Education at a Glance 2022, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado no último dia 3 de outubro, o Brasil é o segundo país com a maior proporção de jovens, com idade entre 18 e 24 anos, que não conseguem nem emprego nem continuar os estudos.
Segundo o documento, 35,9% dos jovens estão nessa situação no país. A proporção brasileira é o dobro da média dos países membros da OCDE, que é de 16,6% de pessoas dessa faixa etária sem trabalhar e estudar. Somente a África do Sul é país com maior proporção que o Brasil, com 46,2%.
O relatório destaca ainda que, no Brasil, só 33% daqueles que acessam o ensino superior conseguem terminar a graduação dentro do tempo previsto. Quase metade (49%) só conclui o curso depois de três anos do prazo programado. O restante desiste da graduação ou termina em um tempo ainda maior.
Segundo o estudo da OCDE, em todos os países analisados, a conclusão do ensino superior está associada a mais oportunidades de emprego e melhores salários.
O Brasil também é o segundo com a maior proporção de jovens por mais tempo nessa condição. Dos que estão sem emprego e sem trabalhar no país, 5,1% se encontram nessa situação há mais de um ano, o que indica uma falta crônica de oportunidades para essa população. Essa etapa da vida é considerada a de transição da educação para o mundo do trabalho, ou seja, quando os jovens deveriam cursar uma graduação ou curso técnico para conseguir um emprego.
O futuro passa pela educação
Nesse cenário, segundo Jorge Luis Nicolas Audy (PUCRS), neste momento da história em que vivemos, emerge com clareza o fundamento para a necessidade voltarmos a ter esperança no futuro.
Esse fundamento não é a inovação. Não é a segurança pública. Não é a questão ambiental ou social. Não é o mercado ou a economia. Todos esses e outros são aspectos importantes, alguns até prioritários. Mas o fundamento da construção de um novo momento para nosso país é a educação. A educação é o fundamento para a construção de uma sociedade que viva plenamente o nosso tempo, o tempo da sociedade do conhecimento e da aprendizagem.
A educação é fundamental na formação das sociedades e das pessoas. É necessário colocar os jovens no centro dos investimentos em educação e propulsionar a educação como promotora de desenvolvimento sustentável. A mudança sustentável precisa acontecer a partir de um olhar de totalidade, que contempla uma perspectiva de longo prazo e que coloca a ênfase nas pessoas.
Neste momento em que perguntamos o que as instituições de ensino podem e devem fazer para formar cidadãos para uma democracia saudável, a literatura ousa propor: desenvolver a capacidade dos estudantes de ver o mundo do ponto de vista dos outros; ensinar posturas com relação à fragilidade e a impotência humana como oportunidades de cooperação e de reciprocidade; ensinar coisas reais e verdadeiras a respeito de outros grupos (minorias raciais, religiosas, políticas e sexuais), de modo a conter os estereótipos e eliminar o preconceito.
Professor armado de teorias e práticas
E ao professor(a), a melhor síntese que podemos indicar sobre como o deve se armar teórica e praticamente para enfrentar as contradições que atravessam o aparelho escolar, as recolhemos de Antônio Gramsci, filósofo italiano (1919): “Instruí-vos porque teremos necessidade de toda a vossa inteligência. Agitai-vos porque teremos necessidade de todo o vosso entusiasmo. Organizai-vos porque teremos necessidade de toda a vossa força”.
Como formação humana, a educação acontece na sala de aula, e em seus arredores. Os horários de entrada e saída dos estudantes e seus professores constituem-se como momentos de alegria, tristeza, medo, ansiedade e, também, de algum tipo de esperança, por menor que seja.
Encontrar os amigos, saber o que se passa com o menino que se senta ao lado, saber o que se passa com a menina que sempre chega atrasada na aula de história, mas não mede esforços para assistir à aula de matemática. O valão continua a céu aberto. O aluguel venceu. O ônibus atrasou. O vale transporte acabou. Bem em frente ao portão da escola, um assaltante faminto clama por comida, diversão e arte (do Ebook Trabalho docente sob fogo cruzado – vol. 2).
Conforme nos legou Paulo Freire: “O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo”.
Sigamos firmes construindo um mundo e um futuro melhor pela cooperação humana.
Se puder, ignore a Filosofia, a Sociologia e a História. São para adolescentes. Arte? É coisa de vagabundos!
Seja uma pessoa normal. Obedeça a seus pais. Vá à escola. Procure ser um bom aluno. Arranje um emprego e uma namorada. Nada de sexo casual, desregrado. Case logo e tenha filhos.
Não beba. Não fume. Fique longe das drogas. Exceto das religiosas e das psiquiátricas. Dessas, pode abusar. Frequente um culto. Cristão, é claro. Pague o dízimo.
Consulte, periodicamente, o psiquiatra. Tome os remédios receitados todos os dias e ganhe um sono forçado, sem pesadelos nem sonhos, repleto de vazios.
Faça um curso superior. Depois um mestrado. Doutorado. Pós-doutorado. Para poder ostentar algum tipo de autoridade. Nem que seja sobre a “rebimboca da parafuseta” kantiana.
Se puder, porém, ignore a Filosofia, a Sociologia e a História. São para adolescentes. Arte? É coisa de vagabundos!
Trabalhe oito horas por dia. Faça hora extra. Não reclame. Agradeça a Deus por ter um emprego. Compre casa. Carro. Moto. Pague IPTU. IPVA. ICMS. Água. Luz. Gás. Bata no peito e diga: “estou ajudando a construir uma nação”. Sorria. Finja estar feliz.
Abra mão de seus sonhos. Em prol da pessoa amada. Dos filhos. Do emprego. Da preguiça. Da covardia. Viva de adiamento em adiamento, ansiando pelo instante de se aposentar.
Louve a meritocracia e, ao mesmo tempo, reclame da falta de oportunidades. Afinal, a meritocracia é ótima — para os outros.
Aprenda a culpar a tudo e a todos por aqueles fracassos que só a você pertencem. Culpe seus pais. Os políticos. O país. A “conjuntura econômica”.
Seja normal. Seja não apenas doente, mas comum. Cópia. Hipócrita. Gente de bem.
A questão é simples de entender: planeta saudável e vida social equilibrada requer, fundamentalmente, a reestruturação dos atuais padrões de consumo e produção, hoje vistas como “forças” pró-desequilíbrio ambiental que respondem, sobretudo, pelos efeitos ecodestrutivos.
O que quer que se pense sobre a espécie humana, ao menos uma coisa é certa: até aqui, não temos nos comportado muito bem no relacionamento com a natureza. Nossas ações e o jeito como habitamos o mundo nos denunciam. Em nenhum outro momento da história humana a biodiversidade esteve tão comprometida como agora.
Nunca os ecossistemas foram tão devastados como estão sendo nesse momento. Com efeito, nos tornamos uma força geológica com efeitos deletérios. Pela primeira vez, estamos nos limites da biosfera, e sabemos agora, diante de tantas evidências, que estamos ajudando a produzir a mais avassaladora e inconsequente destruição de recursos do mundo natural.
Ameaças à natureza, modificando a atmosfera, os solos e o mundo das águas, aliado à pressão exercida pela ação humana sobre a biosfera, capaz de alterar radicalmente os ciclos naturais, deixam claro que o estilo de vida do mundo moderno (a razão ocidental) é incompatível com o processo de regeneração do meio ambiente.
A bem da verdade, é difícil não se surpreender com o estado em que estamos deixando o mundo. Animais, plantas e minerais estão a um só fio. Das 9 milhões de espécies (as estimativas são: 6,5 milhões de espécies terrestres e 2,5 milhões de espécies marinhas) de animais e plantas que habitam o planeta, simplesmente 1 milhão estão sob risco de extinção.
Mas não é só isso. Nos últimos setenta anos, as atividades humanas emitiram três quartos de todo o dióxido de carbono estocado na atmosfera. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), temos hoje em dia cinco vezes mais desastres meteorológicos do que em 1970, e eles provocam custos sete vezes maiores do que naquela época.
Na boa descrição dos fatos, resulta que a perda de biodiversidade, o aquecimento global, o desmatamento, a erosão do solo, o derretimento de geleiras, a acidificação dos oceanos, a degradação de biomas, a poluição das águas, do ar e do solo são, decerto, exemplos clarividentes de como nossas insustentáveis ações, influência humana, para usar outro termo mais refinado, produzem o que se convenciona chamar de desequilíbrio planetário.
Ocorre que, em todo esse contexto, há, de fato, o sentimento de que os desequilíbrios ecológico-ambiental traduzem o abalo às macroestruturas da Terra. Na dúvida, recorramos aos cientistas da Terra que não cansam de nos avisar que, dos 31 “sinais vitais” da saúde do planeta (entre eles, o desmatamento, a saúde dos solos, o derretimento de geleiras, a emissão de gases de efeito estufa), ao menos 18 deles já estão seriamente comprometidos.1
Essa confissão, é lícito dizer abertamente, não consegue esconder as mais sérias consequências que recaem sobre o sistema vida, muitas delas previsíveis. E sem que nos acuse de fazer discurso apocalíptico, o que está vindo em nossa direção é bastante preocupante.
Ainda hoje, em todos os lugares do planeta, a poluição do ar mata mais de 7 milhões de pessoas todos os anos. São inaceitáveis 15 mil mortes por dia. A poluição da água, não menos grave, mata, durante os doze meses do ano, mais de 4 milhões de crianças em todo o mundo. No geral, para dizer de outra forma, as chamadas doenças ambientais estão cada vez mais próximas de nós. Recordemos: num amplo relatório divulgado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) no já distante ano de 2012, fomos informados que uma em cada quatro mortes naquele ano foi causada por questões relacionadas ao meio ambiente. No total, foram 12,6 milhões de mortes.
Em síntese, é por essa razão que a Terra – que regula e mantém as condições de vida – grita alto. Nessa mesma direção, o drama ecológico daí decorrente, do qual já não mais temos controle, fala por si. Sob essa perspectiva, tem sido fácil perceber o caminho do desastre ecológico, agora arrolado na influente ideia do Antropoceno2, quer dizer, a Época do Homem, visto e entendido como vetor de considerável mudança nos ecossistemas globais.
Ainda assim, em linhas gerais, precisamos admitir: com esforço comum e muita vontade política, é possível mudar radicalmente o atual sistema de produção que depreda o planeta. Assim como também é possível alterar o modelo civilizatório, reorganizar a vida de outra maneira, vencer a dívida ecológica, eliminar a diferença e a desigualdade social e avançar com o desenvolvimento humano para todos.
Redobremos a atenção para o que mais importa: se, de fato, quisermos continuar contando a nossa história de vida, já é mais do que tempo de evoluirmos em termos de conscientização ambiental, uma das lacunas mais gritantes que ainda precisamos preencher.
Nesses tempos de urgência, em que os interesses econômicos são colocados acima da questão ambiental, precisamos compreender bem que a qualidade da vida humana (o desejo legítimo que todos anseiam), diretamente associada à preservação da riqueza do mundo natural, está seriamente comprometida. E isso quer dizer exatamente que, entre a busca por um mundo moderno (apoiando-se no desenvolvimento tecnocientífico) e os limites da Terra (nem sempre levados a sério pelos atores sociais), as condições ambientais, das quais depende nossa sobrevivência, estão sendo completamente exauridas. É esse o cenário que precisamos urgentemente desmontar.
Do ponto de vista ambiental, os números conhecidos não deixam dúvidas: trinta por cento das terras aráveis do mundo já se tornaram improdutivas, e nada menos que 63% dos 89 recursos não renováveis que possibilita a existência da sociedade industrial de alta tecnologia, assim comenta Sylvia Lorek3,já tinham se tornado globalmente escassos em 2008. Os ecossistemas globais (ambiente marinho, florestas tropicais, florestas temperadas e etc) continuam sendo degradados com abusiva e comprometedora velocidade.
A vida selvagem já entrou numa espiral de aniquilação, afinal, em apenas 50 anos aniquilamos dois terços dela. Eventos extremos, secas, ondas de calor e surtos de tempestades, como é fácil supor, assustam-nos devido a frequência em que se sucedem. Os territórios continuam sendo devastados e os recursos naturais, outra constatação fácil de ser feita, se aproximam do esgotamento.
Dura realidade, à medida que apelamos ao planeta para suportar a industrialização a qualquer preço, esquecemo-nos de prestar atenção ao fato de que a demanda por bens de consumo pressiona as reservas de recursos da natureza, isto é, o uso global de água doce, a exploração dos oceanos, o uso do solo e assim por diante.
Nessas condições, imaginar que podemos continuar com a expansão do aparato produtivo, sem que se busque ampliar a eficiência energética (fazer mais com menos), ou mesmo sem que se questione a fundo a influente ideia de modernidade, hoje amparada na expectativa do crescimento acelerado e sem fim, é ignorar por completo que, a essa altura, temos sido incapazes de manter o consumo de recursos dentro da biocapacidade do planeta, tanto quanto temos sido incompetentes no que mais importa: a elaboração de um amplo programa de desenvolvimento sustentável.
Definitivamente, e por sorte, desenvolvimento que se preze – outra legítima aspiração humana – deve estar centrado no ser humano e na preocupação ambiental. E apesar do entusiasmo que isso suscita, não podemos nos iludir: exige-se esforço comum de todos os atores sociais para inverter radicalmente a realidade dos dias de hoje, colocando a economia (que é apenas um meio, vale frisar) para servir as pessoas, e não o contrário. Logo, é válido assim imaginar que isso nos ajudará a superar a visão parcial de mundo sustentável que ainda insistimos em manter.
Seja como for, antes de mais nada, há nesse contexto um específico problema de base a ser superado. Apesar de fazer mais de meio século que a comunidade científica dispara alertas de que a civilização moderna se encontra em apuros, ainda hoje tratamos a questão climática (certamente a situação mais grave desse nosso jovem tempo) com posições moderadas.
Em termos de trama ecológica, parece mesmo que ainda temos dificuldade de entender que a crise ecológica contemporânea, sob a benção do Antropoceno, é altamente insustentável. Sequer percebemos com clareza que os principais problemas ambientais são gestados (e mantidos) pela lógica da acumulação capitalista. Por isso tudo, com base nesses princípios, é urgente a conscientização para a tomada de radicais decisões.
Ou paramos de queimar combustíveis fósseis ou o futuro reservado para cada um de nós, estejamos no Sul ou no Norte globais, será incerto e ainda muito mais ameaçador. Ou aprendemos a valorizar a ideia de conservar toda a natureza, ou nem futuro teremos. Ou alcançamos as metas estabelecidas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), redução de 45% das emissões globais até 2030 e emissões zero (netzero) até 2050, ou teremos tempos desagradáveis ambientalmente falando.
Para insistir no assunto que sabemos ser urgente, ou exigimos dos principais governos do mundo a adoção definitiva de uma agenda do desenvolvimento sustentável (o principal tema deste século 21), ou cada vez mais, a partir do nosso modo de viver e com a nossa economia global, afetaremos a resiliência do Sistema Terra (isto é, a capacidade de responder às mudanças e às perturbações).
Por fim, ou entendemos definitivamente que somos natureza, ou nada feito. Ou nos sentimos como elementos do mundo natural, ligados a todo o resto, ou não terá sentido a reconstrução social da realidade, tampouco os princípios que organizam a vida moderna.
Como diz Aílton Krenak, fechando o raciocínio, “ou aprendemos a falar a língua da terra ou vamos ser expulsos do corpo da Terra como uma coisa estranha a esse organismo que produz vida”.4
Para agora enfatizar o discurso ecológico, o desafio da sustentabilidade ambiental se torna cada vez maior à medida que fica bem claro que entramos de vez numa rota de colisão. Na linha de frente, enquanto não pensarmos com seriedade no processo de regeneração do meio ambiente, mudando a lógica da ordem econômica (hoje vestida de imperativo de prosperidade que sustenta o estilo de vida do mundo moderno e que se sustenta na destruição ecológica), não teremos sucesso na busca de um mundo sustentável.
Em última instância, isso quer dizer que precisamos levantar esforços para construir um novo acordo global a fim de seguir a trajetória do equilíbrio planetário.
Mas isso, atentemos, não se restringe apenas a mudança climática, em que pese ser um desafio multidisciplinar e a maior ameaça à humanidade. Numa premissa bem mais radical, enquanto nova sociedade organizada, equilibrada e decidida a buscar um lugar comum, devemos procurar estabelecer uma boa forma de regular a ação humana sobre os recursos naturais da Terra.
Aqui, para além do que é razoável imaginar, precisamos fazer diferente quase tudo o que fizemos até agora. A começar pela busca de outra ideia de desenvolvimento que necessariamente vincule três ações coordenadas visando: (i) transformar a lógica da racionalidade econômica, a partir de um profundo questionamento do atual paradigma da modernidade; (ii) constituir outra economia que valorize maisa qualidade que a quantidade, admitindo que a Terra não pode suportar o atual modelo de civilização dominante; (iii) reconstruir a partir de um éthos de convivialidade o metabolismo Ser Humano-Natureza, conciliando os dois ecos/oikos (termo com a mesma raiz etimológica), o da Economia (ciência social) e o da Ecologia (ciência natural), disciplinas unidas sob o mesmo nível linguístico.
Fugindo do superficial, precisamos entender que isso tudo não será fácil. Há interesses econômicos a serem enfrentados. Embora dificultoso, mudar radicalmente um sistema econômico injusto baseado na exploração de combustíveis fósseis que vem ajudando a destruir a vida no planeta é possível e alcançável, com ou sem saída tecnológica.
Em retrospecto, cônscios da nossa responsabilidade para com o planeta, se quisermos ver mais longe devemos mudar os rumos insustentáveis da sociedade de hoje para assegurar um compromisso de qualidade de vida às gerações futuras. Junto às soluções técnicas e a necessidade de estimular as ecologias dos saberes, necessariamente respeitando as diversidades e aprendendo a valorizar a natureza, parece lícito acreditar que chegou a hora de mudar nosso comportamento e de mudar a direção de nossa economia global.
Tudo isso porque, a rigor, a questão é simples de entender: planeta saudável e vida social equilibrada (valores pelos quais a sociedade humana moderna deve se orientar) requer fundamentalmente a reestruturação dos atuais padrões de consumo e produção, hoje vistas como “forças” pró-desequilíbrio ambiental que respondem, sobretudo, pelos efeitos ecodestrutivos.
Num mundo tão conectado de hoje, diante de uma crise ambiental planetária na qual todos “nos encontramos a descoberto”, como enfatiza Bruno Latour, talvez seja essa a mais elementar mensagem de nosso conturbado tempo.
Notas:
1. Para efeito de esclarecimento, não faz muito tempo que os cientistas assim alertaram: “18 dos 31 ´sinais vitais´ do planeta, incluindo as emissões de gás com efeito estufa, a espessura das geleiras (o derretimento destas, vale a pena lembrar, tem sido 31% mais rápido do que há 15 anos, grifo meu, MEO) e o desmatamento, já alcançaram níveis recordes preocupantes”. (Cf. publicado em BioScience, jun. 2021).
2. Na sugestão de Paul Crutzen, o Antropoceno se inicia por volta de 1800, a partir dos passos iniciais da Revolução Industrial na Europa.
3. Cf.LOREK, Sylvia. “Desmaterialização”, (Verbete 17), in Decrescimento – vocabulário para um novo mundo. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2016, p.124.
4. Cf. KRENAK, Aílton. Habitar o Antropoceno. (Org.) Moulin et alii. BDMG Cultural / Cosmópolis, 2022, p.220.
Autor: Marcus Eduardo de Oliveira
Autor de Economia Destrutiva (CRV, 2017) e Civilização em desajuste com os limites planetários (CRV,2018), entre outros. prof.marcuseduardo@bol.com.br
Neste ano eleitoral teremos de optar: manter amizades ou assumir publicamente um candidato a presidente. Um colega e amigo já foi claro: quem não acompanhar o voto dele não será mais seu amigo. Por quê? Porque ele tem absoluta certeza de que está certo em sua escolha.
Como o sol na foto de meu amigo Juarez Lopes, um ano vai e outro vem. E eu estou parafraseando Mel Brooks, que, aos 95 anos, escreveu em sua autobiografia: “Nunca tomo partido porque todos estão certos”.
Neste ano eleitoral teremos de optar: manter amizades ou assumir publicamente um candidato a presidente. Um colega e amigo já foi claro: quem não acompanhar o voto dele não será mais seu amigo. Por quê? Porque ele tem absoluta certeza de que está certo em sua escolha.
O problema – ou a solução – é que nosso voto tem a ver com nossa história de vida. Inclusive, mantê-lo secreto também. O silêncio sobre política pode, sim, na atual conjuntura maniqueísta, significar a opção pelos amigos.
Esse é um dos meus “bons propósitos” para o ano de 2022. Não sei se vou conseguir.
Essa questão me fez lembrar de uma situação vivida em dois momentos: na adolescência e no velório do meu pai. Deu o acaso de eu estar junto quando meu pai – ele foi prefeito por duas vezes – recebeu em sua casa um amigo que fora avisá-lo de que não votaria nele.
Um homem influente em uma vila da cidade achou melhor contar de viva voz do que deixar a informação chegar por outros, na forma de fofoca. Meu pai disse que ele tinha suas razões e que não havia qualquer problema. Seguiram conversando sobre outros assuntos, rindo e se despediram numa boa.
Assim que ele deixou nossa casa, estabeleceu-se uma polêmica: a reação amistosa era a atitude correta? Afinal, havia uma disputa eleitoral.
Meu pai reafirmou em palavras o que havia mostrado em atitude: a amizade tinha mais valor que a disputa política.
Os anos se passaram, muitos anos, e na noite do velório do meu pai, um homem de bastante idade aproximou-se e perguntou se eu era filho do Wolmar e se eu era o adolescente assim assado… “Sim, lembro-me do senhor porque sua atitude provocou debate na nossa família”, respondi. Disse-me ele que conquistou, na época, a admiração de seus familiares e de muitos na vila em que morava: o sujeito que teve a coragem de ir à casa do candidato dizer que não votaria nele.
E assim foi até o dia da votação. Porém, a fila foi andando, andando, e quando chegou a vez de ele depositar o voto na urna… “Não consegui não votar no Wolmar. Votei no Wolmar e isso me fez muito bem, mas não pude contar para ninguém. Ganhara fama… Com que cara contaria?!”.
E com emoção, completou: “Na frente da urna, percebi que o Wolmar e eu éramos muito iguais. Para nós, a amizade tinha muito valor”.
Para Kátia Alves que me presentou com uma folha do seu cajueiro e em 04 de outubro de 2021 tirou a sua vida porque não tinha quem compreendesse a sua dor.
Para começar este lindo texto que fala de vida, de amor, de cuidado e de cumplicidade, trago a nossa querida poeta Cecília Meireles em suas lindas palavras “Nunca tive os olhos tão claros e o sorriso em tanta loucura. Sinto-me toda igual às árvores: solitária, perfeita e pura”.
As árvores conhecem a solidão e as dores da alma, por isso elas sabem cuidar de nós e dos nossos sofrimentos de angústia, melancolia e depressão. Escute-as por um minuto ou converse com elas um pouco e descobrirá que não está sozinho no mundo.
No início de 1997, fui diagnosticada com uma forte depressão depois de passar três meses numa grande tristeza, chorando e sem querer sair da cama. A vida tinha perdido o sentido para mim. Viver doía internamente e externamente. Os amigos já não eram boas companhias e o meu trabalho perdeu a graça. Eu sabia que precisava de acompanhamento médico e procurei uma psiquiatra. O diagnóstico veio depois de algumas consultas e eu fiquei perdida.
O tempo passou. Os amigos já não tinham mais paciência para comigo. Todos se foram e fiquei sozinha no mundo. Não parecia fácil lutar sozinha contra uma doença que nos maltrata e que não entendemos o motivo de tanta tristeza, dor e lágrimas. De repente, me vi sem ter com quem falar sobre as minhas dores e os meus desesperos.
Lembro-me que morava, nesta época, num condomínio chamado Parque das Palmeiras e que existiam muitas árvores próximas dele. De frente ao meu prédio tinha uma mangueira enorme! Eu era rodeada de árvores.
Sem amigos, com a vida destruída, coração despedaçado e a alma angustiada eu ficava deitada na cama o dia inteiro. Era difícil levantar-me para ir à cozinha ou ao banheiro.
Rede de Proteção à vida (RPV), divulgação.
Tudo era difícil. Qualquer coisa que exigisse o mínimo do meu corpo eu achava cansativo. A dor só aumentava com o distanciamento dos amigos. Todos se foram porque não suportaram ver o meu fracasso. Sem dar por mim havia as árvores do meu condomínio que faziam um tapete de folhas ao seu redor para que pudéssemos passar.
Era uma quarta-feira nublada, lembro-me bem, e parecia mais um dia como qualquer outro quando desci do meu prédio para ir à médica. Só que olhei para a mangueira gigante de frente para mim. Não havia ninguém na rua. Nunca tinha gente na rua naquele local. Naquele dia eu falei para ela que venceria a depressão. Que seria mais forte do que todos pensavam e sairia daquela situação. Fui e voltei da médica como sempre com receitas de medicamentos nas mãos e conselhos de que ficar em casa só prejudicaria mais ainda a depressão. Eu precisava fazer amigos.
Lá de cima eu via a mangueira, mais precisamente do décimo primeiro andar. Ela parecia sozinha igual a mim. No meio da multidão ninguém ligava para ela. Era apenas mais uma árvore que dava sombra, frutos e espalhava folhas ao seu redor. Eu decidi vir fazer companhia para a árvore naquela noite de outono bonita. Cheguei perto dela com timidez e fiquei quieta. Sem nada dizer. A árvore me olhava. Ela sabia que eu não estava bem.
Como sempre, as árvores conseguem nos entender só pelo olhar. Nada precisamos lhes contar. Eu comecei a chorar. Um fruto caiu perto de mim. Depois mais outro. Folhinhas começaram a cair dos seus galhos. Eu senti que ela queria falar comigo.
Num ato de desespero eu abracei a árvore por um bom tempo. Ficamos ali abraçadas olhando para a noite bonita com céu estrelado. Comecei a chorar e contei todas as minhas dores para ela. Eu não sei o motivo, mas vez ou outra achava a árvore parecida com a minha médica que só fazia me ouvir. A única diferença é que a árvore parecia mais amiga, mais próxima da minha alma, mais necessitada de mim. E pela primeira vez dei por mim que havia alguém com mais solidão e tristeza do que eu.
A árvore precisava dos meus cuidados assim como eu precisava dela. Depois de conversar todas as minhas dores para aquela mangueira frondosa senti um grande alívio no peito e fui me deitar. Daí por diante, começou uma grande amizade entre nós duas. Eu não passava mais pela árvore como antes. Nem ela me deixava passar despercebida. Nos cumprimentávamos.
Peguei o costume de levar um livro para ler embaixo dela quando estava de folga na maioria das minhas tardes. Senti que a árvore queria saber o que eu lia e comecei a ler poemas para ela, mais precisamente poemas de Fernando Pessoa e Florbela Espanca que combinavam conosco.
A árvore começou a filosofar junto comigo. Depois passei a desenhar embaixo dela e senti do alto dos seus galhos e caule grosso ela me pedir para que a desenhasse de várias formas. E fiz vários desenhos da árvore. Quando eu chorava diante dela sentia que queria de algum jeito me proteger e jogava folhas sobre o meu corpo. A partir daquele dia, descobri que aquela mangueira frondosa estava me curando da depressão porque ler um livro, fazer um desenho ou escrever um poema eram coisas que eu não fazia há meses.
Aquela árvore além de ser a minha única e melhor amiga porque me escutava sem críticas e comentários tolos, porque não achava ruim que eu a abraçasse chorando e vez ou outra quisesse desistir de tudo sabia como ninguém curar as minhas dores. De fato, passados alguns anos eu consegui vencer a depressão. E não foi nenhum remédio, psiquiatra ou psicólogo que me curou, mas o meu diálogo todos os dias com aquela árvore amiga e cuidadosa onde eu me sentava para receber a sua sombra, os seus frutos e limpar as suas folhas secas.
Sim, as árvores sabem aliviar as dores da depressão. O relato acima não é fictício. Eu o vivi. Eu sou a testemunha de que as árvores são grandes terapeutas. Se acaso você se sente triste, solitário e não vê mais sentido na vida procure conversar com uma árvore perto de você. Abrace a árvore. Conte para ela das suas tristezas e dores.
As árvores são grandes amigas quando lhes damos atenção. Elas sabem o momento exato de nos dar uma resposta. Os seus abraços são os melhores do mundo porque podemos abraçar-lhes com muita força que não vão reclamar.
É como uma terapia com um analista conversar com uma árvore. Elas ficam silenciosas e só nos ouvem. Nós acabamos descobrindo as nossas próprias respostas. É preciso saber interpretar os cuidados das árvores. Apesar de também viverem sozinhas e abandonadas, muitas vezes, elas sabem como ninguém do que lhes falamos e contamos.
Claro que não vamos abandonar as pessoas de carne e osso pelas árvores, mas nas horas difíceis em que nos vemos sozinhos no mundo e temos uma árvore perto de casa é com elas que podemos desabafar e falar dos nossos sentimentos e emoções. Elas nunca se cansam de nos ouvir. Não reclamam de que sejamos falantes ou silenciosos. Seus galhos conseguem nos ninar balançando pra lá e pra cá. E se ouvirmos com atenção elas até cantam para nos embalar em seus galhos finos e podermos dormir embaixo dos tapetes das suas folhas ou encostados nos seus troncos grossos.
Dizem que ter um amigo na terra é um tesouro e eu lhes digo mais quando esse amigo é uma árvore o tesouro parece encantado e mágico. As árvores são como as mães, elas se sacrificam por nós. Elas são capazes de morrerem para nos ver felizes. Você não precisa nem conversar em voz alta com as árvores para que não lhe chamem de louco ou maluco, basta ficar perto delas, basta lhes demonstrar carinho e cuidado que em troca elas serão grandes companhias.
O filósofo francês Michel de Montaigne tinha um grande amigo chamado de La Boétie para quem escreveu o ensaio “Da amizade” eu tenho a minha mangueira no quintal da minha casa para quem escrevo todos os dias poemas tristes e alegres conforme o estado do meu espírito. Já o filósofo Cícero nos perguntou “Existirá algo mais agradável do que ter alguém com quem falar de tudo como se estivéssemos falando conosco mesmos?”
Acho que só com as árvores podemos nos sentir assim a não ser que você tenha amigos como os de mamãe que contam sessenta ou setenta anos de amizade. O problema é que não temos mais tempo para os amigos e os laços de amizade agora são líquidos.
Sabe aquele amigo que você queria sempre disponível? Pois bem, assim são as árvores. Elas estão sempre no mesmo local à nossa espera. Nunca estão ocupadas. Nunca estão cansadas. Nunca dormem ou ficam emburradas. Sem contar que entendem muito bem as dores da depressão porque quando estamos muito tristes e não sabem como resolver a nossa tristeza elas acabam ficando tristes junto conosco deixando os seus galhos caírem e as suas folhas secas se espalharem por todos os lugares.
Ah! se soubéssemos o quanto as árvores podem aliviar as dores da depressão, visitaríamos menos os consultórios psiquiátricos e faríamos menos análises. Se valorizássemos essas árvores que vivem perto da gente e estão ali prontas para nos ouvir sem censuras e sem comentários que muitas vezes só doem mais ainda dentro da gente abrindo a ferida cada vez mais tenho a certeza de que haveria menos suicídios e mais pessoas felizes no mundo.
Eu fico triste quando sei que alguém tirou a sua própria vida por causa da depressão quando ao seu lado tinha uma árvore que podia ter lhe salvado, bastava ter sido vista com os olhos de quem necessita de cuidados.
Não! Eu não quero que você largue o seu tratamento psiquiátrico ou a sua análise terapêutica. Isso também ajuda no tratamento da depressão. Eu só quero que você saiba que é possível sentir alívio da depressão conversando com uma árvore todos os dias ou quando sentir vontade. Pois comigo foi assim. Ainda é assim quando chego no quintal da minha casa e converso com o meu cajueiro. Quanto mais formas de tratamento você encontrar melhor será.
Nas árvores a gente sente que é acolhida como o carinho de uma mãe que se preocupa verdadeiramente conosco. A gente pode contar os mais bobos pensamentos para elas, chorar até se cansar ou ficar horas abraçados aos seus troncos que não vão se importar.
E quando abraçamos as árvores recebemos da natureza, da mãe Terra e dos deuses a energia necessária para que possamos viver melhor e se ficarmos em silêncio completo e adentrarmos no espírito da sabedoria da vida perceberemos o quanto essa energia nos traz felicidade, amor, bondade, solidariedade e paciência.
Para quem não tem uma árvore em casa ou perto pode ir até um bosque ou parque ambiental. Apesar de o homem está derrubando as árvores para construir prédios e abrir estradas, ainda assim há muitos lugares onde elas existem e são bem cuidadas. Se você experimentar só por um momento fazer isso que eu fiz acima e proporcionar a si próprio uma conversa com uma árvore verá o quão maravilhoso será este momento.
As árvores nos respondem das suas formas e aos poucos aprendemos a decifrar as suas respostas.
Uma árvore nunca lhe deixará na fila de espera para lhe atender. Nem se mostrará aborrecida quando você a deixar por uns tempos sozinha. Sequer vai questionar o que você anda fazendo que sumiu, de repente. Ah! Essas maravilhosas amigas que a natureza nos ofereceu e não sabemos valorizá-las, elas parecem que foram criadas para nos ajudarem nas horas difíceis quando não temos ninguém por perto e a dor da depressão nos invade.
Se a depressão é o mal do século XXI, as árvores seculares são a cura para essa doença, porque cada vez mais não temos ao nosso dispor pessoas que queiram nos ouvir e saibam nos compreender. Nos jogamos nos tratamentos medicamentosos e precisamos passar o resto das nossas vidas tomando pílulas e mais pílulas para sentirmos um pouco de alegria, sim, um pouco.
Se você conseguir ser amigo de uma árvore verá que não é preciso tomar pílula nenhuma para receber a energia da natureza que invade o nosso espírito e nos leva para outros mundos além metafísica capaz de nos dar vontade de viver além séculos. Ficamos tão motivados a viver que queremos pular para o alto na tentativa de alcançar os galhos das árvores para neles nos dependurarmos. Viramos crianças novamente.
Não há mistério ou segredo para se conversar com uma árvore. Basta se colocar embaixo dela e ficar ali quieto. Sem dizer palavra alguma. Se sentir vontade de chorar, chore. Se sentir vontade de abraçá-la, abrace-a. Faça somente o que sentir vontade. A árvore jamais vai dizer que você não é um bom amigo. Quando estiver muito triste e com vontade de sumir para sempre, antes procure sentir a energia de uma árvore sentando-se embaixo dela e contando tudo o que está sentindo. Você verá que a vontade de sumir desaparecerá em segundos.
Quem dá amor também quer receber, não é verdade?
Pois bem, saiba cuidar da sua árvore. Se ela é a sua melhor amiga seja a melhor amiga dela também ouvindo-a sempre que puder, pois as árvores também conversam dos seus modos. E elas as podem dizer coisas maravilhosas que você nunca imaginou existir ou que elas sentissem. Você pode querer saber se existe árvore ciumenta e a resposta é não. Todas elas são amigas e solidárias. Na mãe natureza só há espaço para as virtudes, pois as árvores não costumam usar de vícios para conquistarem o que desejam.
Sim, as árvores também podem ficar tristes e iguais a nós sentirem angústias e entrarem em depressão, por isso elas conseguem nos compreender tão profundamente, afinal para conhecer a dor do outro verdadeiramente é preciso já ter a vivenciado ou experimentado.
Saiba cuidar e dar amor a sua amiga árvore. Quem sabe ela está precisando de cuidados iguais a você e ambas podem se curar sendo cúmplices no compartilhamento dos afetos.
Nunca se sinta sozinho e mesmo que perto de você não tenha nenhuma árvore, imprima uma foto de alguma que encontrar na Internet e coloque perto de você. Converse com ela sempre que sentir vontade que mesmo à distância ela vai ouvir a sua voz e transmitirá a energia necessária para o alívio da sua dor.
Jesus Cristo dizia ao homem de pouca fé que ele poderia movimentar uma montanha se quisesse, pois eu lhe digo que você pode se curar através das árvores se acreditar nisso. Claro que é preciso crer com todas as forças da sua alma.
Antes de tentar tirar a sua vida, devido a depressão ou a solidão, busque os cuidados de uma árvore, como último recurso para a cura da sua dor que ninguém consegue compreender. Elas nunca pedirão paciência, nunca dirão que é falta de fé, nunca mandarão você rezar ou coisa parecida e o mais importante nunca chamarão você de fraco, ao contrário elas vão lhe acolher em seus troncos e galhos. E tenha a certeza de que a mãe Terra junto com toda a natureza trabalhará pela sua cura.
Para concluir, deixo vocês com o querido poeta Olavo Bilac e os versos do seu poema “Velhas árvores” que nos diz:
“Olha estas velhas árvores, mais belas / Do que as árvores moças, mais amigas, / Tanto mais belas quanto mais antigas, / Vencedoras da idade e das procelas… / O homem, a fera e o inseto, à sombra delas / Vivem, livres da fome e de fadigas: / E em seus galhos abrigam-se as cantigas / E os amores das aves tagarelas. / Não choremos, amigo, a mocidade! / Envelheçamos rindo. Envelheçamos / Como as árvores fortes envelhecem, / Na glória de alegria e da bondade, / Agasalhando os pássaros nos ramos, / Dando sombra e consolo aos que padecem!”
Que possamos envelhecer com a vontade de viver muitos séculos e rindo das coisas mais bobas da vida porque a depressão não mata quem tem como amiga uma árvore tagarela.
Os olhos abertos pode ser que estejam só olhando e vendo pouco. Há muitos olhos que olham bem, mas que não veem quase nada.
Educar a visão é uma tarefa muito exigente e pode levar uma vida inteira para adquirir este aprendizado laborioso. Ver é um aprendizado que exige paciência e habilidade pedagógica. Ensinar alguém a ver é muito mais do que ensinar a olhar.
Aprender a ver, em sua amplitude, está para além do olhar. Pode parecer um paradoxo, mas muitas vezes o olhar não se encerra no ver. “Como me espelho no olhar do outro? Como o outro se espelha no meu olhar?”
Ver é a capacidade de dirigir o olhar para realidade que nos circunda. Um olho “defeituoso” pode impedir o olhar, mas não o ver. O ver é interno. Já o olhar é externo. O primeiro está voltado para apreensão do visto e o segundo está voltado para as apresentações fenomênicas. O ver e o olhar sempre implicam numa densidade intrapsíquica. Acostumamos o olhar e, muitas vezes, vemos pouco.
As descobertas e as criações intelectuais são, em sentido estrito, aprender a ver as mesmas coisas com olhares novos. Já nos ensinava Merleau Ponty que filosofar é aprender a ver o mundo. Isto significa dizer que o ver não é uma questão fisiológica estrita, mas implica uma educação noética.
O ver da inteligência não é um olhar para fora, mas é sempre um ato reflexivo do visto. Olhar duas vezes não significa passar pelas coisas que se nos apresentam fenomenicamente.
A reflexão não é algo espontâneo, mas é um trabalho cognitivo que exige tempo e paciência para filtrar aquilo que “entrou pelas nossas retinas” e que nos traz inquietação espiritual e curiosidade intelectual.
O exercício espiritual exige, “ver com os olhos fechados”. Ver com os “olhos fechados” é ampliar a visão. É ir além da consciência intencional que sempre procura descrever o que viu. Por isso ver não é nominar as coisas do mundo, mas perceber o que as coisas do mundo nos dizem.
O ver não é uma passividade epistêmica frente ao mundo fenomênico, mas uma atividade reflexiva sobre o fora e o dentro das coisas. Uma coisa é olhar as coisas extrinsecamente e outra coisa bem diferente é ver a realidade intrinsecamente.
A relação entre o ver e o olhar exige um “terceiro olho” que é a instância que nos leva a ver o próprio olhar, no ato de ver. Não há nada mais emocionante para a inteligência quando ocorre a proximidade dos olhos para ver os olhares singulares. Ver o próprio olhar.
Olhar falando e falar olhando é o ato contemplativo genuíno da razão apaixonada e da emoção inteligente. Mas isto só acontece quando se consegue ver o olhar numa proximidade infinita entre dois ou mais olhares.
Um olhar penetrante tem muito mais força cognitiva do que uma cifra de muitos silogismos bem articulados e demonstrados logicamente. O ver da inteligência não acontece só com o desempenho da gramatologia, mas acontece quando se abre para a alteridade que vem de fora sem os “laços conceituais.” Aprender a ver significa ler o mundo com “as lentes” do intelecto.
Os olhos abertos pode ser que estejam só olhando e vendo pouco. Há muitos olhos que olham bem, mas que não veem quase nada. É por isso que muitas vezes não adianta limpar as lentes, mas é necessário trocar os óculos.
Há muitos cegos biológicos que veem melhor o mundo do que aqueles que têm os olhos em perfeita saúde. Aprender a ver é recolher para dentro do interior da psique os mistérios insondáveis do mundo, que só enxergamos quando este se mostra. Ver bem é captar o olhar que vê.
Inspire-se com a estação das flores, das cores e dos amores
Sinta o perfume que está no ar
Curta a liberdade de correr, de andar e de pular:
de bola, de bicicleta e de piscina.
Aprecie como a natureza revela a sua beleza
e como as pessoas se mostram belas também
Para ter paz e felicidade,
é preciso amar a si mesmo, aos outros e a natureza.
Primavere-se!
*Esta poesia foi uma construção do professor com estudantes do terceiro ano da EMEF Benoni Rosado, em Passo Fundo, RS, na primavera de 2018, Projeto Filosofia.
Olhando de longe, parece-me que as vilas, neste período eleitoral, estão muito quietas. Apenas alguns poucos eufóricos saíram para o limpo. Fora isso, prevalecem as conversas reservadas ou ao pé do ouvido. Essa silente conduta das vilas é enigmática. E é exatamente nesse silêncio que poderemos encontrar muitas respostas.
Quando há uma bipolarização no cenário político, além de um divisor ideológico, também observamos condutas distintas de parte a parte. Uma turma fala mais alto e expõe os seus pensamentos abertamente. O outro lado fica mais acanhado, como se estivesse sob ameaça.
Isso faz lembrar uma época em que apenas era permitido enaltecer um grupo, enquanto as ações do outro lado tinham características da clandestinidade. Na cabecinha de uma criança, isso pode representar um faroeste com rótulos de mocinhos e bandidos.
Agora, com essa divisão, nos colocaram numa sinuca de bico. E, nesse jogo de bilhar, o risco não é apenas cair na caçapa. Sim, tem gente bicando ou usando o bico para muita trela. Ou treta!
Porém, certamente, a abertura do bico é uma conduta que serve de parâmetro para compreensão do momento. Assim, voltamos àquilo que a qualificação imaginária define como bonito ou feio. Em outras palavras, o que é ou não é politicamente correto no momento.
Ora, a dimensão dos bicos não está na mídia, nem nas redes sociais e muito menos nos debates públicos. O mais preciso termômetro não tem rótulo partidário, imagem preparada ou posição social. É a maneira como os bicos se comportam próximos ao seu ninho. Essa vitrine encontramos nas bodegas da vida e nas conversas pelas cercas entre vizinhos. É o papo informal que corre solto nas vilas. Centro ou periferia, o comportamento é quase o mesmo. Uns falam mais, outros menos.
Porém, é nas vilas que encontramos maior autenticidade na maneira de ser. Isso também vale para avaliar o momento político.
Se o resultado não tem valor científico, a lógica coloquial estará sempre acima da sua própria margem de erros. É uma pesquisa empírica embasada na metodologia dos bares da vida.
Olhando de longe, parece-me que as vilas estão muito quietas. Apenas alguns poucos eufóricos saíram para o limpo. Fora isso, prevalecem as conversas reservadas ou ao pé do ouvido. Essa silente conduta das vilas é enigmática. E é exatamente nesse silêncio que poderemos encontrar muitas respostas.
O barulho dos candidatos
Fico abismado ao ouvir buzinas e alto-falantes na campanha política. Nos últimos dias, ocorreram barulhentos desfiles liderados por candidatos a deputado. Além do péssimo exemplo para homens públicos, isso é um desrespeito aos ouvidos alheios.
Para produzir ruídos já temos muitos idiotas por aí. Necessitamos de candidatos com propostas para coibir o barulho.
Políticos, pelo que sei, teriam a obrigação de transmitir educação e respeitar as leis. Barulho é poluição sonora. Candidato que faz barulho é poluidor. E essa contaminação associa a imagem do candidato à degradação. Então, obviamente, meu voto não acompanha a descompostura dessa péssima conduta.