Em defesa do amor

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Defendamos o amor. Eu e você sabemos, o amor jamais é culpado.
Por amor se morre, mas jamais se mata.

Não sei de ninguém que tome suco de sal quando sedento. Tampouco conheço quem regue flores com água fervente. Contudo, muitos, por aí, acusam o amor de assassino, mandante de barbaridades. Não se trata daquela metáfora antiga para seduzirmos: teu amor me mata. Acusam o amor de pistoleiro e mandante do crime. Acusam o amor de assassino. Imputação absurda como a defesa de guerras justas.

A cada hora deste ano quinhentas mulheres sofreram algum tipo de violência. Muitas delas feridas de morte por maridos ou companheiros. A maioria após romperem um relacionamento. Ouvi da boca de alguns desses agressores ou assassinos a desculpa de que estavam motivados por uma emoção muito forte por causa do amor. Resumindo, a culpa era do amor, esse ser invisível. Segundo esses amorosos maridos ou parceiros, o amor apossara-se deles como um espírito obsessor, movera braços e punhos, pegara as armas e, em alguns casos, o amor é que havia estrangulado aquela mulher. Houve até um caso em que o amor jogou uma garota pela janela de um apartamento.

 Os agressores e assassinos pareciam falar com a mesma propriedade como Jesus: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos que ama”; como São Francisco: “Por amor deixei todos os bens e optei pela irmã pobreza.” Justificam-se como Tereza de Calcutá: “Por amor entreguei minha vida aos pobres e doentes.” Quem lhes deu autoridade para a profanação do amor?

Defendamos o amor. Eu e você sabemos, o amor jamais é culpado. Por amor se morre, mas jamais se mata.

Seja a defesa do amor a solidariedade, a caridade, a entrega e o perdão. Defendamos o amor pela prática do carinho, da ajuda, do sacrifício e da tolerância. Defendamos o amor pela alegria gratuita, pelo abraço dos amigos.

Defendamos o amor como o fazem as mães, como filho que prepara o futuro, como os pacificadores em qualquer canto, como Zilda Arns, como Dom Hélder Câmara. Falemos do amor como quem recolhe animais abandonados das ruas, como os bombeiros em Brumadinho, como os missionários em lugares remotos, como os médicos sem fronteiras, como os defensores dos direitos humanos, como os que morreram pela ecologia.

Principalmente, defendamos o amor em nossa família: trabalhando dignamente para ter uma casa bonita, grande e segura; sacrificando-nos para que os filhos tenham uma vida boa, façam faculdade, saibam três ou mais línguas.

Defendamos o amor construindo um muro real e simbólico ao redor da casa, para que a violência não entre. Mas tenhamos cuidado! Será que tantas preocupações com o mundo não nos farão esquecer o amor em sua pátria mais simples? De que adianta proteger-nos do mundo exterior quando há uma janela sem tranca no coração daqueles que nos rodeiam?

Há momentos em que o amor pode nos salvar. Sua defesa é imprescindível e deve ser ostensiva, para que o encontremos à mão quando preciso. Mas o amor verdadeiro se defende apenas pela prática, com exemplos efetivos a começarem no lar, cuidando as janelas do coração dos filhos, por exemplo. Jamais poderemos estar entre os sedentos tomando sal; ou entre os jardineiros com água escaldante em seu regador.

Estou aqui pensando se no lugar da excludente de culpabilidade “por violenta emoção”, que o ex-juizinho da República de Curitiba colocou no projeto milagroso, não seria melhor colocar um crime, com pena perpétua, para aqueles que falam que o amor move braços para agredir, punhos para esmurrar, que o amor pega armas para disparar, que o amor é um ser invisível e incontrolável no desejo de sangue.

Estão tomando o santo nome do amor em vão. Precisamos de providências urgentes. Especialmente para salvar meninas e mulheres.


“O amor extravagante sofre as intempéries, desgasta-se com a poluição, fica ao risco das pragas, e ao expores ao mormaço as raízes sem o esmero da sutileza causarás, embora indesejado, o seu ressecamento”. 

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