Quando o homem se torna lobo do próprio homem

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A possibilidade do “homem ser lobo do próprio homem” é um perigo que espreita quando não há instituições suficientes para evitar esta possibilidade. Nesse sentido, a instituição escolar fortalecida, que promove a formação de seres humanos conscientes da importância do bem comum, é essencial para a natureza egoísta selvagem dos gananciosos não se sobreponha ao coletivo.

O filósofo britânico Thomas Hobbes (1588-1679), embora não possa ser considerado um pensador liberal, teve uma importante influência na fundamentação do individualismo moderno.

A obra de Hobbes composta por diversos livros dentre os quais destacam-se Do cidadão (publicado em 1642), Elementos do direito natural e político (1650) e o Leviatã (1651), este último considerado um clássico da teoria política moderna, que chegou a ser censurado pelo Parlamento inglês, teve uma influência marcante no desenvolvimento da discussão sobre as relações entre indivíduo e Estado em todo o período moderno. Suas ideias ainda hoje são estudadas no campo do direito, filosofia, sociologia, antropologia e filosofia política. Mesmo sendo um pensador que escreveu no século XVII, suas ideias continuam sendo instigantes para entender o tempo presente.

Hobbes tem uma concepção negativa e pessimista da natureza humana, pois considera o homem um ser naturalmente agressivo e propenso a violência. O “estado de natureza ou natural” em que o homem se encontraria fora da sociedade organizada e sem a presença de um governo, seria um “estado de guerra de todos contra todos”.

O homem, diz Hobbes, é “o lobo do próprio homem”, pois é movido por paixões e desejos que o levam a matar e destruir seu semelhante quando se sente ameaçado. O estado de natureza na análise de Hobbes não descreve o homem primitivo, ou o homem anteriormente a qualquer organização social, mas sim como o homem se comportaria, dada a natureza humana, caso não houvesse a obrigação de cumprir as leis e contratos impostos pela sociedade. Sem leis e contratos viveríamos uma luta incessante entre os indivíduos, um tentando destruir o outro.

Na interpretação de Hobbes, os homens são essencialmente iguais e as diferenças entre os indivíduos são consideradas irrelevantes, pois mesmo o mais fraco tem o poder de matar o mais forte. Por isso, para o pensador inglês, é fundamental a criação do Estado ou do Poder Soberano. O poder soberano existe para impedir o estado de natureza e permitir a coexistência entre os homens, já que nesse estado os indivíduos tenderiam a se exterminarem uns aos outros.

A criação da sociedade, com suas leis e contratos, pressupõem que os indivíduos cedam uma parte dos seus direitos e os transfiram para um soberano. Essa concessão e transferência de direitos e poderes consiste em um contrato social, por meio do qual se institui a sociedade civil organizada e se evita “a guerra de todos contra todos”. Com isso Hobbes justifica a existência do Estado em suas distintas formas de organização.

Hobbes pode ser considerado um “contratualista”, pois sua teorização sobre o poder ressalta que a sociedade civil organizada resulta de um pacto entre os indivíduos. No entanto, historicamente ele foi acusado de absolutista, por defender que o poder absoluto deve ser considerado legítimo enquanto assegura a paz civil.

A complexidade social que vivemos hoje certamente é muito diferente daquela teorizada por Hobbes. No entanto, a legitimidade de um poder só se justifica quando suas ações congregam, de alguma forma, os interesses de todos. Para que a paz civil seja possível, é necessário que os indivíduos acreditam nas instituições que os representam. Quando isso é arruinado, temos a convulsão social, o rompimento do pacto e a instabilidade social.

Um olhar cuidadoso sobre as teorizações de Hobbes nos permitem perceber o quanto estão enganados aqueles que acreditam que é necessário enfraquecer o Estado (estado mínimo como gostam de dizer os neoliberais). Sem o Estado estaríamos entregues a própria a sorte e a força cruel dos abastados economicamente que na ânsia de terem cada vez mais seriam capazes de utilizar as estratégias mais sórdidas para dominar a maioria. Sem o Estado e suas instituições teríamos de volta a escravidão e a lei do mais forte.

A possibilidade do “homem ser lobo do próprio homem” é um perigo que espreita quando não há instituições suficientes para evitar esta possibilidade. Nesse sentido, a instituição escolar fortalecida, que promove a formação de seres humanos conscientes da importância do bem comum, é essencial para a natureza egoísta selvagem dos gananciosos não se sobreponha ao coletivo.

A solidariedade comunitária, própria de uma sociedade democrática, se torna um princípio educativo fundamental para constituir um modo decente de se viver.

Autor: Dr. Altair Alberto Fávero

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