“Desculpe tocar no assunto”

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“Desculpe tocar no assunto” é o título de uma crônica de Rubem Braga: “Nos piores momentos de minha vida sempre senti uma mão em minha cabeça; então fecho os olhos e me entrego a esse puro carinho, sem sequer me voltar para ver se é uma doce amiga ou apenas a leve brisa em meus cabelos”.

Quando jovem, perdi um colega e amigo – também jovem -, o Romeu: além da dor, senti constrangimento. Já a perda do colega e amigo Lori, faz pouco, trouxe-me sofrimento, mas não constrangimento.

Fazíamos, Romeu e eu, o estágio do sexto ano na Santa Casa de Porto Alegre, porém em enfermarias diferentes. Quase diariamente, num determinado horário da manhã, nos encontrávamos para um rápido cafezinho. Largando a xícara, Romeu mostrou-me a palma de sua mão: “Está azulada, não sei por quê. Já marquei consulta”.

Era um tumor inoperável no pulmão! O Romeu foi hospitalizado, fez quimioterapia e outros procedimentos.

Aquele encontro para o café foi o último em que nos sentimos bem à vontade um com o outro. Quando o visitava no hospital, além de olhares tristes, havia constrangimento entre nós. Era visível que seu estado não lhe permitiria viver muito. Ele não sabia o que dizer… Eu não sabia o que dizer…

Passaram quase cinquenta anos… Visitei o Lori, colega e amigo, no hospital, dias antes de ele falecer. Não tivemos nenhum constrangimento. Não falamos na doença grave que o afligia. Para que falar nela? Naquelas alturas, já havíamos internalizado que a vida é o que é. O melhor era recordar nossos bons momentos. Jogávamos futebol juntos. O Lori era muito bom! Rimos, inclusive.

Com o Romeu, com todas as vivências que ele poderia ter perdidas, não tinha como não ficar constrangido. Não conseguíamos nem falar. Já com o Lori, falamos, falamos, e nos demos as mãos.

“Desculpe tocar no assunto” é o título de uma crônica de Rubem Braga: “Nos piores momentos de minha vida sempre senti uma mão em minha cabeça; então fecho os olhos e me entrego a esse puro carinho, sem sequer me voltar para ver se é uma doce amiga ou apenas a leve brisa em meus cabelos”.

É assim, “com puro carinho”, que o filme “A história de nós três e de nós quatro” toca no assunto. Com a direção de Jaime Lerner e com minha participação como roteirista e ator, trata do reencontro muito afetivo de uma família após a perda do familiar que os unia. As canções de Paulo Reichert ajudam a narrar a história. Filmado em Passo Fundo, RS, é um longa de 74 minutos.

Estará em exibição em uma das salas do CINELASER do Passo Fundo Shopping na próxima semana.

As primeiras sessões serão destinadas aos alunos de nossas faculdades de medicina e de outras profissões da saúde. Mas a sessão de sexta, dia 01 de setembro as 19:30 será aberta a todos os interessados com ingresso na bilheteria do cinema. E no dia seguinte, 2 de setembro, sábado, às 10h no anfiteatro da Atitus, no Campus Santa Terezinha, abordarei o tema em palestra dialogada. Todos estão convidados!

Autor: Jorge Alberto Salton

Autor da crônica “Sentir-se culpado é ruim; se sentir responsável é bom”: https://www.neipies.com/sentir-se-culpado-e-ruim-se-sentir-responsavel-e-bom/

Edição: A.R.

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