Em entrevista exclusiva para o site, Bernadete Dalmolin
responde a questões que envolvem sua história pessoal e
o desejo coletivo de fazer uma gestão inovadora na
UPF (Universidade de Passo Fundo) a partir do diálogo,
da humanização e da gestão compartilhada.

 

Professora Bernadete, como avalias o processo da eleição para a Reitoria em 2018? O que significa a vitória da proposta de um grupo de pessoas que propôs a gestão compartilhada para a nossa querida UPF?

Foi um importante momento de participação, de avaliação e de discussão de projetos para a universidade que queremos nos próximos anos. A vitória da proposta do Movimento Ação UPF significa que a comunidade acadêmica deseja avançar, efetivamente, na vivência da gestão democrática, envolvendo os docentes, discentes e técnicos-administrativos, orientando-se pelas relações dialógicas e de humanização.

A UPF tem uma organização colegiada muito clara, mas ela deve ser fortalecida e ressignificada institucionalmente, potencializando a capacidade de análise, de resolução, de eficiência e de agilidade, sem prejuízo à educação que caracteriza o ensino universitário.

 

Quais foram e quais são as motivações pessoais para estar à frente da UPF para o período de 04 anos? O que de sua trajetória pessoal e profissional estará impregnado na forma de gerir a Universidade?

A principal motivação é, sem dúvida, compartilhar um projeto de Universidade em que a UPF reforça seu caráter comunitário, aprofundando a concepção de uma Instituição formadora e de produção do conhecimento contribuindo para o desenvolvimento da região. Além disso, dar vazão e voz ao enorme capital intelectual acumulado nessas cinco décadas de história.

“Entendemos que é com transparência e agregação das pessoas, com as capacidades de cada uma, que nos potencializaremos em torno de um projeto comum”.

Penso que sempre tem um encontro de trajetórias num coletivo como este que se constituiu no Movimento Ação UPF. Da minha trajetória, acredito que estarão presentes algumas características, comoo diálogo, a capacidade agregadora, a transparência e o afeto.

Quais são, hoje, os maiores desafios da gestão desta Universidade num contexto de crise institucional, política e econômica, mas também de um tempo onde o próprio papel da educação vem sendo questionado?

É preciso considerar o contexto de criseeconômica que, neste momento, afetam visceralmente as Instituições Comunitárias. Aliado a isso, as profundas transformações da educação superior, como a massificação dos sistemas, as formas de competição entre instituições de ensino superior, o tensionamento entre o público e o privado, assim como as inovações tecnológicas. A UPF necessita conviver e dialogar com esse tempo, enfrentando cautelosamente as dificuldades, fazendo as adequações necessárias e, abrindo-se às inúmeras possibilidades que ele traz consigo.

“Entendemos que é necessário aprofundar o papel das Instituições Comunitárias, reforçando seu caráter de instituição pública não estatal. Cumprimos, ao longo da história, um papel fundamental, fazendo frente a “vazios educacionais” (não cumpridos pelo Estado) e impulsionando o desenvolvimento das regiões”.

Buscaremos, em conjunto com as nossas associações, intensificar essa pauta junto aos órgãos governamentais, a fim de abrir frentes de financiamento diferenciadas às nossas ICES.

Assumimos como orientação a visão de futuro segundo a qual uma grande universidade comunitária se faz com excelência acadêmica, sustentabilidade econômica, interação com a comunidade, produção do conhecimento e gestão compartilhada. Isso significa que, internamente buscaremos equilibrar colegialidade e pró-atividade na gestão, movendo-nos com agilidade frente aos desafios e sermos resilientes na preservação dos valores acadêmicos.

 

Como é conciliar ensino, pesquisa e extensão no século XXI de tantas transformações?

É um desafio, pois requer uma ruptura de uma base formativa que está arraigada em modelos (teorias, metodologias e práticas) bastante tradicionais, fruto de um processo histórico e fragmentado de fazer ciência, de aprender e de ensinar.

Penso que é no entrelaçamento dessas dimensões que poderemos encontrar novos sentidos às atividades acadêmicas do nosso tempo, ou seja: ao fazermos pesquisa, geramos extensão (ou vice-versa), transformando a sala de aula em um ensino mais dinâmico aos nossos estudantes.

Nós temos condições de acelerar esse ambiente inovador, a partir do relacionamento com os diferentes públicos, de identificação de oportunidades, de negociação, de cooperação, inovando nossos currículos, fortalecendo e abrindo linhas de pesquisa e tornando, cada vez mais, nossa “casa UPF” e nossa comunidade um lugar mais qualificado para crescer e se desenvolver.

“Este papel está na gênese da universidade e, num mundo cada vez mais plural e complexo, com diferentes e variadas formas de vida, o que faz a diferença é essa integralidade que potencializa a formação de um sujeito crítico, ético, aberto ao diálogo, com capacidade de pensar por si mesmo, com olhar abrangente, sensibilidade imaginativa e responsabilidade social”.

O que significa para ti, para a instituição e para a própria comunidade geral a eleição da primeira reitora mulher da Universidade de Passo Fundo?

O mundo da gestão ainda é eminentemente masculino. Romper a lógica hegemônica, neste caso, também é importante e inovador. Que pena que é a primeira vez em 50 anos, até porque as mulheres sempre estiveram presentes no cenário da educação brasileira, mas que bom que aconteceu agora (na UPF as professoras somam mais de 40% do total).

Creio que isso será muito importante para que outras mulheres possam ocupar espaços de gestão, trazendo para esse campo, características que são próprias ou mais aguçadas no gênero feminino.

Em momentos da campanha eleitoral ouvíamos depoimentos que expressavam “incômodos” com a possibilidade da UPF teruma reitora, como por exemplo: “uma gestão complexa não é para pessoas sentimentais, emotivas”, dentre outros, buscando desqualificar características e negar trajetórias (inclusive de gestão).

“Penso que precisamos superar pré-conceitos que reforçam uma cultura dominante de um perfil masculino para os cargos da alta gestão”.

Acho que as diferenças entre homens e mulheres são salutares e complementares e, promover a igualdade de gênero no lugar do trabalho, é uma questão justa e inteligente, aproveitando as competências e talentos de cada um/uma, também nos espaços estratégicos de condução e de tomadas de decisão.

 

Qual é a sua visão sobre a construção de um conhecimento para a humanização, que é uma das propostas do nosso site? (a ideia que defendemos é de que, através do conhecimento reflexivo, podemos superar a nossa ignorância e nos tornarmos assim pessoas melhores).

Falar em humanização é falar em relações, em reconhecimento do outro como sujeito de direitos e saberes.

“É preciso deixar claro que não estamos falando apenas de cordialidade, ou de momentos de uma reunião dos funcionários com seus dirigentes, estamos falando de uma postura, de uma prática cotidiana. Estamos falando do resgate e fortalecimento do que é ser sujeito, ser HUMANO”.

Entendo que a construção de um conhecimento para a humanização passa pela superação de uma cultura institucional fortemente assentada nos modelos de gestão, que vem de determinadas escolas clássicas e que ainda são fortes na sociedade. Modelos esses, que produziram como efeito, a dominação, a separação entre quem pensa e quem executa o trabalho, a alienação. Formas não compatíveis com uma gestão de educação da natureza da nossa.

Para isso, instituiremos modos de trabalho que produzam tanto compromisso e convivência solidária com o interesse comum, quanto capacidade reflexiva e autonomia dos diferentes espaços de gestão. Dito de outra forma, trabalharemos fortalecendo a capacidade de ser, de pensar, de refletir, de criar e de fazer de cada um.

 

O que a comunidade acadêmica e comunidade geral pode esperar da gestão compartilhada para os próximos quatro anos? Qual será a marca e a identidade de trabalho desta gestão que representas como reitora?

Pode esperar uma gestão em que todos importam e todos serão convidados a participar, a refletir e a decidir. Assim, acreditamos que iremos ampliar a autonomia de gestão das unidades e dos cursos e potencializar a capacidade de análise, de resolução, de eficiência e de agilidade.

 

Por fim, como defines numa frase você, Bernadete Dalmolin.

Uma pessoa presente, de diálogo, de fácil convivência e que se inquieta com injustiças de toda a ordem.

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