A perspectiva é que se não houver
mudanças drásticas no modelo de produção,
essa civilização se afogará em seu próprio lixo.

 

No decorrer da história foram construídas diferentes percepções sobre o lixo, desde a percepção e a associação ao inútil, até uma percepção ecológica. O fato é que ele ajuda a contar a história de muitas civilizações, até mesmo a nossa.

A palavra “lixo” sempre esteve associada ou definida como tudo aquilo que se descarta que não mais pode ser utilizado, resultante de diferentes atividades, sejam elas domésticas, comerciais e industriais, dentre outras. Na idade média, a idéia de lixo (excedentes humanos) era restrita aos resíduos eliminados pelos organismos, como fezes, urina e o próprio corpo em decomposição. Desta forma, ele era apresentado como uma ameaça aos seres humanos, especialmente por ser a causa do surgimento de grandes epidemias.

Com a revolução industrial, o desenvolvimento de técnicas e as descobertas científicas possibilitaram a ampliação da percepção do lixo. Passou-se a compreender que a própria emissão de gases poluentes é uma forma de lixo. A partir da década de 70, mudou-se a perspectiva de percepção desses excedentes humanos, e passou a ser uma das grandes preocupações ecológicas, sobretudo, por causa da industrialização crescente.

Atualmente, um dos grandes debates que ganham força política é a relação excedente versus meio ambiente. É um debate que se insere também na agenda dos direitos, especialmente ao direito à saúde ambiental. Um direito que por muito tempo vem sendo negligenciado pelo poder público, especialmente, aos mais pobres.

O fato é que com a modernidade, particularmente no ramo da indústria moderna, a produção de resíduos cresceu enormemente. Na ponta inicial do processo industrial, para atingir a eficácia da produção em massa, exigiu que se cortassem, aparassem, segregassem, separassem ou extirpassem as partes de matéria prima. Na verdade, cortamos as árvores, demolimos as montanhas para extrairmos os metais, consequentemente, poluímos a água e o ar.

A história das coisas.

O grande problema desse sistema de produção em massa é com a sua própria sobrevivência num planeta finito. Deparamos-nos hoje com escassez de recursos naturais, devido à utilização demasiada e descontrolada, buscando cegamente o desenvolvimento e o crescimento econômico.

Mas o problema não acaba por aqui.

No final desse processo, na outra ponta do sistema, emergem os excedentes humanos, os resíduos como subproduto do processo. Que fim dar a ele? O que fazer com esse excedente?

Ele sempre foi encarado como inútil, mas com um potencial desastroso, por isso criou-se a indústria de manejo do lixo. Infelizmente, as medidas tomadas não foram suficientes para neutralizar ou amenizar os perigos de sua exposição. O manejo ocorreu através da criação de aterros sanitários, ali os excedentes da humanidade poderiam ser transportados e depositados. O grande problema é que, adotamos um sistema altamente poluente para nossas águas, solos e ares.

Outro fator problemático é que devido à urbanização desordenada há enorme carência de espaços para a construção de aterros. A oferta de aterros sanitários é cada vez menor, enquanto a produção de lixo prossegue inabalável. Os sinais são claros, caminhamos para a autocombustão e explosão do sistema atual. A perspectiva é que se não houver mudanças drásticas no modelo de produção, essa civilização se afogará em seu próprio lixo.

Conforme descreve o sociólogo polonês Zygmunt Bauman: “A modernidade tem sido suspeita de uma tendência essencialmente suicida, semelhante uma cobra comendo seu próprio rabo”, o problema é que ela nunca sabe quando o estômago será seu alimento.

O século XXI, apesar da perspectiva de avanços científicos e tecnológicos, caminha sob o signo da incapacidade de incluir no ciclo de uso o destino ecologicamente correto para as montanhas de excedentes gerados pela humanidade e depositados em lugares impróprios. Nos bastidores do Estado e do mercado temas como crescimento, desenvolvimento e sustentabilidade são atualmente os grandes desafios, assim como a necessidade de efetivar ações e criar uma nova concepção.

Precisamos apostar na reciclagem, para isso primeiro devemos mudar nossa percepção sobre o lixo nos livrando daquela velha mentalidade que o associava ao inútil. Ele é fonte de riqueza, muitas pessoas poderão tirar o sustento para suas famílias, em um trabalho ecologicamente correto.

Repensar, reduzir, reutilizar, reciclar.

É tempo de reestruturar esse sistema linear, cujo ciclo pode ser resumido em extração, industrialização, uso e descarte. Precisamos transformar esse sistema linear em algo novo. Atualmente há iniciativas que pensam todo o processo produtivo no modelo de “ciclo fechado”, são iniciativas baseadas na sustentabilidade, equidade, energia renovável. É um sistema circular que não desperdiça recursos e nem pessoas. É nessas iniciativas que precisamos apostar.

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