Sua família não é melhor que a minha

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É engraçado como o discurso bolsonarista é sexualizado. Eles, que nos apontam promíscuos, depravados e muitas vezes até pedófilos e adeptos à sexualização infantil, não perdem a oportunidade de sexualizar os discursos que proferem e que seus próprios filhos escutam, como bem apontou Contarato.

O título é uma frase dita pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES) nesta quinta-feira (30/09), dirigindo-se ao empresário bolsonarista Otávio Fakhoury. O bolsonarista, em rede social, apontou um erro de ortografia cometido por Contarato, também em rede social, com o seguinte comentário homofóbico: “O delegado [Contarato], homossexual assumido, talvez estivesse pensando no perfume de alguma pessoa ali daquele plenário… Quem seria o ‘perfumado’ que lhe cativou?”

Conheça o vídeo do senador Fabiano Contarato: https://youtu.be/Ne12U7WY_4s?t=24

É engraçado como o discurso bolsonarista é sexualizado. Eles, que nos apontam promíscuos, depravados e muitas vezes até pedófilos e adeptos à sexualização infantil, não perdem a oportunidade de sexualizar os discursos que proferem e que seus próprios filhos escutam, como bem apontou Contarato.

O bolsonarista agiu como um moleque. Aliás, todos eles, os bolsonaristas, me lembram os moleques da minha escola, naquela fase em que falar de sexo é novidade e é necessário falar o tempo todo, assim como é importante falar da feminilidade do coleguinha pra poder afirmar a própria masculinidade. Infelizmente, de 2018 pra cá, o 5º ano do ensino fundamental assumiu o poder executivo do Brasil.

Já me disseram, amigos e conhecidos, que levo política muito a sério. Pessoas que tomam por “política” apenas questões partidárias de uma porção de siglas iguais (só muda as letras), e muita farinha do mesmo saco, tomando decisões em uma esfera separada de tudo o que nós, mortais comuns, vivenciamos no dia a dia.

Tem essa visão (embaçada) de política, quem goza de alguns privilégios. Há privilégios que fazem com que tu consigas tocar a tua vida sem preocupação com decisões políticas, sem assistir o JN ou sem buscar o que o JN não mostra (em fontes seguras, por favor!). Eu, apesar de gozar de alguns privilégios na vida, pela falta de outros me aproximei de muita gente que, assim como eu, vive à margem de um bocado de “confortos”.

Já fui cuspido na rua por careca com cruz suástica tatuada no corpo. Já me jogaram garrafa por estar abraçado em outro cara. Coisas que aconteceram enquanto um deputado federal, que nada trabalhava, mas muito vociferava ódio na mídia, dizia sem medo de punição, que filho quando ficava “gayzinho” tinha que levar porrada. Anos depois esse mesmo deputado se tornaria presidente da república.

Também já fui insultado e quase agredido fisicamente por gente que gritava, dentro de uma câmara de vereadores lotada (Passo Fundo-RS), que a minha forma de amar corrompe crianças e destrói a família, enquanto vereadores aprovavam uma tentativa de censura de discussões sobre respeito à diversidade na escola, e tiravam foto com a bandeira do Brasil Império.

Falar de política, pra mim, não é algo a ser feito da boca pra fora. Demanda esforço, demanda remexer na minha história, no meu passado, nas minhas feridas e nas dores de todas aquelas e aqueles que compartilham das mesmas lutas que eu, ou que se assemelham e se aproximam por empatia. Por isso, a fala do Contarato me emocionou tanto: pela verdade, pela potência, pelo lugar de fala e pela lucidez.

Contarato fez o bolsonarista pedir desculpas publicamente e isso é grande, mas não basta. O lugar dessa gente é a lata de lixo da história e é pra lá que devemos mandá-los, e que depois sejam aterrados com a vergonha de serem quem são, sentimento com o qual tanto tentam nos sufocar, mas nosso orgulho não deixa.

Levo para vida dois nomes de professoras que demonstraram sensibilidade aos meus piores momentos na vida escolar, e tentaram, mesmo sem embasamento algum, me acolher e incentivar. Isso me leva a acreditar que os termos “gênero” e “sexualidade” inseridos em documentos da educação, sozinhos, não são capazes de estancar o sofrimento e a expulsão/evasão escolar. É preciso lutar por formação continuada e valorização das/os profissionais da educação. Leia mais: https://www.neipies.com/lgbtfobia-educacao-e-disputa-nos-curriculos-escolares/

Autor: Oscar de Souza

Edição: Alex Rosset

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