Nem padre, nem religioso: sou professor

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A escola pública deve promover o
conhecimento das diferentes religiões,
sem quaisquer formas de proselitismo
e preferência religiosa.


O professor de Ensino Religioso, que trabalha na perspectiva do diálogo e do conhecimento inter-religioso, sempre deve ter mente aberta, compromisso com o conhecimento das diferentes religiões e ousadia para enfrentar o desapego de sua convicção ou crença religiosa.

Todos deveriam reconhecer diferenças entre fé, religião e espiritualidade. Fé sempre é uma questão pessoal, uma forma e uma relação íntima de cada um com o Transcendente. Religião é a experiência coletiva da vivência da fé (não por acaso, nas religiões os seguidores se chamam de irmãos ou irmãs). Já espiritualidade, remete a uma dimensão sempre maior, que pode e deve ser pensada na perspectiva das aulas de ensino religioso. Espiritualidade é Cuidado: consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com o Transcendente.

Recorro a memórias afetivas de estudantes em dois níveis: ensino fundamental séries finais e Ensino Médio. As duas memórias revelam o reconhecimento de práticas em sala de aula.

Um estudante do sexto ano fez uma constatação interessante. Logo após expor para a turma, de forma entusiasmada, o sentido do Ensino Religioso para a formação integral do ser humano e para a construção do sentido da vida, o aluno me interrogou: -O senhor deveria ser pastor ou padre -. Imediatamente, sem pensar muito, respondi: “nem padre, nem pastor ou líder religioso, eu prefiro ser professor. Se fosse padre ou pastor, falaria apenas a partir de uma religião. Como professor, posso apresentar e falar de várias religiões, sem comparar e nem desmerecer uma em detrimento de outra”

“Um estudante do Ensino Médio, depois de umas quinze aulas, resolveu abordar-me. Perguntou se eu era ateu. Resolvi interrogá-lo: – Por que você acha que o professor é ateu? Ele me respondeu: “professor, o senhor faz uma aula de ensino religioso desapegado. Eu tinha uma professora conhecedora de muitas religiões, mas ela não conseguia livrar-se do moralismo. Sempre acabava querendo enquadrar a gente, afirmando como a gente deveria viver”.

O Ensino Religioso, no paradigma inter-religioso, cumpre importante papel na formação integral do ser humano, no reconhecimento das dimensões históricas, psicológicas, sociais, culturais e religiosas de cada ser humano e de todo mundo.

Ao longo destes últimos quinze anos trabalhando com a disciplina do Ensino Religioso, especialista em Metodologia de Ensino Religioso, conheci pessoas, vivi experiências de trocas de conhecimentos, visitei templos religiosos e dialoguei muito sobre o universo religioso. Assumo que sei pouco, quase nada, sobre as tradições religiosas.



O objetivo das visitas de conhecimento é complementar e ampliar os conhecimentos das tradições religiosas já estudadas em sala de aula, conhecendo os lugares e as referências físicas (templos ou prédios com funções religiosas). O conhecimento mais rico das diferentes religiões nem sempre está disponível e compreensível em livros, vídeos ou na internet.

 Minha maior aprendizagem é que me percebo um melhor cristão. Sou católico, apostólico e romano. Sigo e vivo minha religião, mas o conhecimento das outras religiões em nada afetou minha fé e nem minhas crenças. Muito antes, pelo contrário, vivo minha religião de forma livre e leve, sem a carga dos preconceitos e discriminações.

Uma lembrança aos colegas que, como eu, desafiam-se a orientar os jovens sobre os conhecimentos do Ensino Religioso: não esqueçamos de reconhecer os conhecimentos religiosos que já integram a vida dos estudantes; de integrar os diferentes conceitos, habilidades e atitudes que as outras áreas do conhecimento despertam em nossos adolescentes e jovens. Não esqueçamos de integrar às nossas aulas os diferentes saberes que são gerados na comunidade, nas famílias, nos templos, nas ruas e no cotidiano de todos nós.

O Ensino Religioso, como os demais conhecimentos, não cabem num livro, num caderno ou numa lousa. Cabem mesmo em mentes abertas e corações capazes de se desapegar das paixões, dogmas e fundamentalismos, característicos de seguidores de algumas religiões.

A escola pública é laica, não significa que ela seja atéia! A escola pública pode e deve promover o conhecimento das diferentes religiões, sem quaisquer formas de proselitismo e preferência religiosa.



Numa experiência inédita em nossa cidade, alunos das séries finais de uma Escola Municipal de Passo Fundo, RS, participaram de uma viagem de estudos, deslocando-se por cerca de 330 Km, em meados do mês de junho de 2019, para o município de Três Coroas, para conhecer o Templo do Budismo Tibetano.

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