Você gostaria de receber o mesmo tratamento que os negros recebem?

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Jeferson Tenório, escritor, professor e pesquisador brasileiro, escreveu mais esta importante reflexão sobre dia 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra, propondo aos leitores e leitoras que vista a pele dos negros como um exercício de compreensão sobre a vida que levam e sobre o tratamento que os mesmos recebem da sociedade. Sua coluna foi publicada no dia 15/11/2022 no Jornal Zero Hora.

“Se sua resposta for “não” é porque você tem consciência de como os negros são tratados no Brasil.

Mais uma vez nos aproximamos do 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra. Um dia de reflexão proposto pelo poeta gaúcho Oliveira Silveira.

Proponho o seguinte exercício: vista a minha pele enquanto você me lê.

Imagine que você está preparando uma janta e lembra que não tem um item importante da receita. Você pensa em ir ao supermercado com a roupa que está. Mas antes, passa pelo espelho. Não acha bom sair de qualquer jeito. Precisa estar bem vestido. Troca de roupa. Caminha pelas ruas, são quatro quadras apenas. Logo à frente, uma senhora desconfiada olha para atrás, você não quer que ela ache que você é um suspeito que vai assaltá-la.

Decide atravessar a rua. Mais adiante, um carro da brigada passa por você. É um momento tenso, porque você lembra das 15 vezes que foi abordado apenas por ser negro.

Quando entra no supermercado, olha para o segurança e dá “boa noite”. Ele te olha de volta, mas não responde. Você está com pressa, mas não pode ser apressado. Sabe que não pode simplesmente pegar um produto com rapidez e ir para o caixa. Você precisa parecer inocente. Porque você já é naturalmente suspeito. Sua tarefa é sempre provar o contrário. Provar que não é um criminoso, que só quer terminar sua janta.

E se por um acaso não encontrar o item, você não pode simplesmente sair. O segurança vai desconfiar, vai achar que foi ali para roubar. Entre os corredores, você vê o mesmo segurança atrás de você. Fica na dúvida se está sendo seguido. Acaba levando um produto qualquer para não acharem que furtou algo. Vai para o caixa, paga e depois passa pela porta com receio de que aqueles detectores apitem por qualquer motivo e seja acusado de roubo.

Descrever esta cena cotidiana me faz pensar que tipo de mentalidade é essa, que tipo de imaginário tão fundante e profundo que se instalou em nossa psique social e de lá nunca mais saiu? Que tipo de imagem é essa que não se desfaz, que não se transforma em alteridade?

Que tipo de relação cruel e violenta se criou em torno da cor da pele? Que tipo de sociedade é essa que teima em julgar pela aparência?

O processo colonialista foi tão traumático que parece ter moldado nosso comportamento para sempre.

Então, se você sabe como os negros são tratados todos os dias é porque sabe que o racismo existe e que o problema é seu também”.

Autor: Jéferson Tenório

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