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Pobreza e compaixão

[quote_box_right]“Se eu dou comida a um pobre, chamam-me de santo, mas se eu pergunto porque ele é pobre, chamam-me de comunista.” (Dom Helder Câmara)[/quote_box_right]

A defesa das causas dos pobres é uma tarefa muito árdua. Exige-nos mais do que compreensão, discursos e teorias sobre a pobreza, mas, sobretudo, compromisso e compaixão. Somos muito preconceituosos para com o sofrimento e a situação indigna como vivem os pobres. Desconhecemos a sua realidade e não queremos mexer na raiz dos nossos problemas: a nossa forma de organizar o mundo. É muito forte entre a gente a ideia de que pobres são coitados, desprovidos de sorte e de bens. Se não lutam, são preguiçosos. Se lutam e exigem mudanças tornam-se perigosos. Mesmo quando passam fome, insistimos em dizer que eles ainda deveriam ser capazes de sonhar.

A lucidez da razão e a sensibilidade podem tratar bem das questões da existência e convivência humanas. Na visão ocidental, no entanto, desenvolvemos a ilusão de que só a razão nos dará respostas aos problemas humanos. Nem a razão ornamental (que serve de ornamento), nem a razão instrumental (ferramenta para transformar a realidade) são capazes de justificar o sofrimento e a realidade daqueles que excluímos socialmente (os pobres). Os pobres não são invenção, não são uma ideia. Os pobres são reais. Os pobres existem e sofrem a violação da sua vida e dignidade.

Leonardo Boff, defensor incansável das causas dos pobres e oprimidos, afirma que são três as compreensões que se tem da pobreza. Uma primeira, clássica, é a ideia de que o pobre é aquele que não tem. A estratégia então é mobilizar quem tem para ajudar a quem não tem, através de ações assistencialistas, sem reconhecer a potencialidade dos mesmos. A segunda ideia, moderna, é aquela que descobre os potenciais do pobre e compreende que o Estado deve fazer investimentos para que ele seja profissionalizado e potencializado, com vista à inserção no mundo produtivo. Ambas as posições desconsideram, na visão de Boff, que a pobreza é resultado de mecanismos de exploração, que sempre geram enormes conflitos sociais. Boff acredita que é preciso reconhecer as potencialidades dos pobres não apenas para engrossarem a força de trabalho, mas principalmente para transformarem o sistema social. Os pobres, organizados e articulados com outros atores da sociedade, são capazes de construir uma democracia participativa, econômica e social. “Essa perspectiva não é nem assistencialista nem progressista. Ela é libertadora.”

Só a compaixão se reveste de libertação. A compaixão não é sofrer pelos outros, mas sofrer com eles. O sofrer com os outros permite colocarmo-nos no seu lugar. Ver a partir dos seus pontos de vista e das suas realidades. É também deixar-se transformar, permitindo que os nossos mais nobres sentimentos se traduzam em ações concretas a favor dos pobres, fracos e marginalizados.

Poucos vivem a compaixão. Muitos perderam a sensibilidade, o que os impossibilita de viver a caridade e o amor ao próximo. Outros preferem atribuir aos pobres a culpa pela sua situação de miséria e vulnerabilidade. Outros discursam democracia, não perguntando se esta propicia as mesmas condições e oportunidades a todos, como ponto de partida. Porque o ponto de chegada depende de cada um de nós. E muitos, em grande número, tratam como crime a atitude de quem luta por causas humanitárias, quando estas exigem uma mudança na estrutura e organização da sociedade.

“As pessoas são pesadas demais
para serem levadas nos ombros.
Leve-as no coração.”,
disse Dom Hélder Câmara.

Este é o sentido maior da compaixão para com os pobres: não os defendemos por serem bons ou anjos, mas porque são parte de uma sociedade desigual, que não sabe lidar com eles.

Partido do bem

Constatei que há cada vez mais gente querendo ser “uma pessoa de bem”. Em busca de explicações e razões de ser deste desejo, comecei a conversar com colegas e amigos. Para minha surpresa, muitos concordaram na percepção de que há uma multidão querendo “ser do Bem”.  Confessaram-me que muitos necessitam dizer-se do Bem, para diferenciar-se dos demais.

[quote_box_right]“Certamente todos pronunciam a palavra Bem, mas não percebem o que ela pode ser.” (Hermes, sábio do Antigo Egito)[/quote_box_right]

Decidi sugerir a organização de uma Irmandade ou um “Partido do Bem”. Num país que já tem 33 partidos, estes poderiam ajudar na democratização das ideias, representando o Bem como uma poderosa ferramenta para combater todo o mal, principalmente as sofisticadas “maracutaias” que teimam em “tomar nosso dinheiro público”. Tal ação favoreceria todos que desejam ser do Bem agrupar-se, criando uma Plataforma de Intenções, talvez um debate mais amplo sobre o que vem a ser o próprio Bem. Talvez pudessem, com urgência, registrar esta organização na Justiça Eleitoral, para concorrer a cargos eletivos nas mais diferentes esferas de organização política da sociedade, representando e argumentando pelas ideias do Bem.

Em busca de razões mais consistentes sobre o desejo de ser do bem, pensei comigo: como pode alguém querer ser do Bem? O que é o Bem? O posicionamento a favor do Bem é em contraposição ao Mal? Quem poderá ser do Bem? Afirmar-se do Bem não é contrariar a nossa condição humana, de pessoas incompletas, que convivem com as mais variadas contradições de pensamento e de ação? Não é muito tênue a linha que nos separa do Bem e do Mal?

Pensei ainda se conseguiríamos, de fato, conviver harmoniosamente com uma pessoa absolutamente boa. Da mesma forma, se conseguiríamos suportar uma pessoa absolutamente má em tudo o que pensa e faz. Percebi então que não suportaríamos, por óbvio, nem os absolutamente bons e nem os absolutamente maus. Seria chato e perigoso demais conviver com estes.

Conclusão: somos, por natureza humana, pouco bons e pouco maus. Nem tanto ao céu, nem tanto ao inferno, estamos em busca do necessário equilíbrio. As religiões sabem disso, por isso sua insistência em nos ajudar a equilibrar os pensamentos e as ações cotidianas.

Os que precisam diferenciar-se dos outros devem sofrer por seu perverso egoísmo. Só o ego pode explicar a razão de ser daqueles que necessitam se declarar pessoas de bem. O reconhecimento do bem e da maldade que a gente faz, pelas palavras e pelas ações, sempre é prerrogativa dos outros. Não pode ser jamais prerrogativa subjetiva, para alguém achar-se superior ou mais importante do que os outros.

Rendo-me aqueles que desejam ser do Bem, mas não posso concordar com eles.

Derrota da Seleção Brasileira, não do Brasil

Na Copa do Mundo de 2014, o povo brasileiro está jogando um bolão! Como nenhum povo e cultura no mundo, soube acolher e aplaudir os milhares de turistas que aqui vieram se divertir, comemorar e integrar-se com nossa cultura. Soubemos, como ninguém, aplaudir o bom futebol, cultivar os melhores relacionamentos e respeitar a diversidade cultural do mundo que passou por aqui.

Soubemos valorizar a nossa cultura e a nossa história. Sem medo de expor as nossas contradições, mostramos o melhor que temos e manifestamos ao mundo o orgulho de ser brasileiros.

A Seleção brasileira não jogou o melhor futebol e, no jogo com a Alemanha, decepcionou geral. Mesmo assim, com esportividade, os jogadores e o técnico Felipão souberam reconhecer os erros e admitir o fracasso.

O Brasil sairá desta Copa muito maior do que entrou nela. Revigoramos as nossas esperanças e, podem apostar, o futuro pertencerá a todos aqueles e aquelas que verdadeiramente acreditam no Brasil e que se dispõem a lutar por mais conquistas e cidadania.

As aventuras de uma má escalação e formação da Seleção brasileira deixemos na conta de Felipão. As escalações da política, no advento das eleições gerais de outubro, os brasileiros saberão fazer, sem sobressaltos e sem falsas ilusões.

Nossa democracia se consolida com o orgulho, a coragem, a luta e a disposição dos brasileiros que querem fazer o Brasil avançar sem retroceder. O povo é sábio porque não deixa que lhe tomem a esperança. Quem viver, verá!

“Brasileiros não desistem nunca!”

Mais Brasil

Desde a Copa de 1998, escrevo sobre a realização das Copas do Mundo e a participação da Seleção Brasileira neste grande evento esportivo. Acredito que estádios de futebol representam para os brasileiros “espaços de construção de identidade, de cultivo de bons valores humanos e espaço para viver e experimentar os melhores relacionamentos”. Acredito que, em todas as Copas do Mundo, brasileiros e brasileiras fazem uma revisão de si mesmos, jogando com seu orgulho, sua cidadania e seu amor à Pátria como componentes fundamentais da identidade brasileira.

Em 2014 não faltaram aqueles que quiseram ensinar um novo jeito de torcer por esta nação e pelo futebol brasileiro, sendo contra aquilo que vem de nossa alma e nossa essência: o gosto pelo futebol. Mas “erraram o pulo”, pois para a imensa maioria, o futebol reflete as diferenças, os potenciais, os talentos e a criatividade. O futebol representa muito do nosso povo, de sua postura e de sua vontade de vencer e apresentar-se ao mundo.

O Brasil não precisa mais impressionar ninguém, em nenhum quesito, muito menos no futebol. O Brasil deve se fazer respeitar por tudo aquilo que tem de bom e todos os brasileiros deveriam orgulhar-se do país que somos. Esta é a atitude fundamental para continuarmos lutando, diariamente, por um Brasil cada dia melhor. Este imenso país possui um povo que não pode ser subestimado por sua inteligência, criatividade e ousadia.

O falso pessimismo que tentaram imprimir neste país tem a ver com a resistência às mudanças substantivas que ocorreram no Brasil nos últimos anos, para a maioria dos brasileiros. Tem a ver com a ampliação das possibilidades democráticas de vivermos a cidadania, nem sempre bem vistas por aqueles que se sentem donos desta nação. Tem a ver com um novo e importante advento que se aproxima: as eleições gerais.

Os brasileiros provam, mais uma vez, que a maior riqueza está na garra, na fé e na esperança que se fazem na luta cotidiana de cada cidadão e cidadã brasileira. Os brasileiros manifestaram que querem mais do que já conquistaram, mas sabem que não existem mágicas nem ideias “mirabolantes” que irão mudar o percurso da ampliação de sua cidadania.

Emprestamos nossa terra, nossa altivez e nossa cultura para a realização do maior espetáculo do mundo. Sem medo de expor ao mundo nossas contradições, durante a realização da Copa do Mundo, fomos nos alimentando daquilo que mais temos de bom. Apesar de excessos de uma minoria, unimos os nossos sentimentos de brasilidade nos mais equidistantes rincões e comunidades deste país.

A Copa do Mundo pode não trazer título à nossa Seleção, mas já nos trouxe de volta o que queriam nos tomar: a fé e a esperança de que nosso país vai dar certo! Brasileiro de verdade acredita no Brasil e age nas horas certas. Sabe que este país tem uma enorme dívida com a cidadania e com a falta de oportunidades para com a maioria dos brasileiros: pobres, explorados, sem estudo, sem trabalho, sem saúde, sem dignidade. Esta conta quem vai pagar é a nossa rica nação brasileira e quem deve exigir é a organização e a luta da coletividade, agora alimentada por um sentimento de “mais Brasil”.

Política sem reflexão

Temos a impressão de que as futilidades e as superficialidades tomaram, definitivamente, o lugar da reflexão. Não temos tempo para nos ocupar com os pensamentos, mas temos um ingênuo orgulho em nos ocupar com as coisas que despertam o entretenimento, o descompromisso e os prazeres mais imediatos. Fomos transformados numa massa amorfa, acomodada, com poucos vestígios de indignação e questionamento. Somos bons consumidores de tudo aquilo que outros pensaram ser o melhor para a vida da gente.

[quote_box_right]”Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos à parte nenhuma.” (José Saramago, escritor e dramaturgo)[/quote_box_right]

O mais intrigante e perigoso em nossa cultura de não-reflexão é que abrimos mão das responsabilidades para com a gente e para com o mundo. Sem reflexão, não geramos conhecimentos. Sem os conhecimentos não temos compromissos senão com a nossa própria ignorância. Sem compromissos com a vida e com o planeta, parecemos mais livres e mais soltos. Será?

Sempre nos ensinaram que pensar é algo perigoso. Que o melhor é adaptar-se aos processos que organizam o mundo. Que a gente deve cuidar de si e deixar Deus cuidar de todos. Que os insatisfeitos e descontentes se retirem do lugar ou da posição em que se encontram no caso de discordância com aquilo que parece imutável.

O bom é que a democracia neste país sempre dá seu “ar de graça” por conta das eleições gerais, a cada dois ou quatro anos. Ela exige, por isso mesmo, que os desafios por ela postos sejam superados. Em vez de alienação, é o convite para definamos nossa participação e nossos votos em vista de soluções para nosso Estado e nosso País.

A real efetivação da democracia exige a participação consciente e engajada dos cidadãos e cidadãs na definição e condução de políticas e projetos, o que não se traduz apenas no voto. A democracia, neste sentido, é uma forma de convivência que exige a superação da alienação dos sujeitos. As pessoas envolvidas num processo democrático devem participar das decisões, evitando ao máximo o distanciamento entre aqueles que decidem e aqueles que executam.

Os grandes pensadores sempre são grandes incompreendidos. Saramago alertou a humanidade sobre as suas cegueiras em obra intitulada Ensaio sobre a cegueira. A partir de seu alerta, ser sem ideias pode ser a pior das cegueiras que poderemos possuir. Nesta cultura de não-reflexão, ainda há espaço para perguntar sobre as possibilidades da gente mudar o panorama da “alienação massiva” na qual estamos todos mergulhados. Somente a cidadania ativa é capaz de enfrentar a alienação política!

Cegueiras de ideias

[quote_box_right]”Não é triste mudar de ideias. Triste é não ter ideias para mudar.” (Barão de Itararé)[/quote_box_right]

Cada vez é mais comum deparar-se com alguém intolerante com as ideias que não sejam as suas. Intolerante com as ideias e pensamentos alheios, muitos desejam “eliminar” os seus contrários ou contraditórios. Em nome da verdade, pregam e vociferam contra tudo e contra todos que, supostamente, possam contrariar suas certezas.

Todos deveriam ter a sua ideologia. Todos deveriam seguir determinadas ideias para não ser pensados pelos outros. Todos deveriam manifestar suas opiniões, mas sem a pretensão de anular os pensamentos dos outros. Todos deveriam praticar o exercício da escuta respeitosa. Todos deveriam considerar que alguns não mudarão as suas ideias, mas que o tempo e a persistência das afirmações poderão encarregar-se de mudanças bem significativas nos modos de ser, pensar e agir de todos. É preciso sempre acreditar que as lições de vida sempre se encarregam de modificar as pessoas.

Na política e na religião as ideias rígidas e fixas tornam-se extremamente perigosas. As ideologias cristalizam verdades absolutas, com as quais é impossível dialogar. Quando não há mais diálogo, abrimos espaço imediato para ações desprovidas de razão. Aí então a emoção e a paixão cegam as pessoas, levando-as a agir sem a medida da razão. Perigoso mesmo é quando as mesmas ideias produzem catarses coletivas, também chamadas de “lavagem cerebral”.

Cada um desenvolve um método para lidar com os intolerantes e insensatos. Tudo o que estes esperam é que a gente reproduza a sua intransigência. Por isso mesmo, é preciso exercer muita paciência, associado ao tempo e ao bom senso. Antes tarde que mais tarde, muitos reconhecerão não a nossa razão, mas a consistência daquilo que a gente pensa e daquilo que a gente faz. O que nos derruba diante dos outros é sempre a incoerência.

A abundância das informações no mundo do conhecimento imprime a ideia de verdade como uma busca, não como uma afirmação definitiva. A questão que se coloca agora é como lidar com esta perspectiva da verdade, num momento que a humanidade, contra a sua evolução, afirma-se em novos fundamentalismos. Como afirma o poeta alemão Henry Charles Bukowski Jr,

[quote_center]“o problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas e as pessoas idiotas estão cheias de certezas”[/quote_center]

Cegueiras fazem mal às pessoas e não permitem que suas ideias sejam modificadas, mas servem de pretexto para impor suas verdades absolutas. Eu prefiro evitá-las!

Redes, estádios e ruas: o Brasil e a pluralidade da democracia

Filhos e filhas do Brasil não fogem à luta e torcem pelo Brasil. A Copa do Mundo de 2014 é um evento festivo e esportivo onde será jogada a cidadania, o amor à pátria e um dos mais queridos e praticados esportes em todos os recantos de nosso país.

Concordo com a tese de muitos de que o futebol pode servir como forma de alienação do povo brasileiro, mas não é o evento da Copa que nos tornará alienantes ou alienados neste país. Critiquemos, pois, a forma com que o futebol vem sendo conduzido nos últimos anos no Brasil e no mundo.

Os brasileiros, no futebol, nas redes e nas ruas, descobrem-se novos sujeitos, capazes de reinventar a história e os destinos de seu país. Os estádios e as ruas sempre foram, essencialmente, espaços de construção de identidade, de cultivo de bons valores humanos e espaço para viver e experimentar os melhores relacionamentos.

Os brasileiros reinventaram-se pelas redes sociais. Os jovens encontraram uma forma legal, rápida e eficaz de comunicar os seus anseios e necessidades mais imediatas e concretas.

E fizeram das ruas o lugar, por excelência, de sua verbalização. Que coisa bem boa e bem feita!

O futebol brasileiro reflete as nossas diferenças, as nossas potencialidades, os nossos talentos, a nossa criatividade. O futebol é um dos espetáculos brasileiros que representam muito do nosso povo, de sua postura e de sua vontade de vencer e apresentar-se ao mundo.

O esporte é o lugar da superação, da disciplina, da projeção pessoal e coletiva, do descortinar. O Brasil sairá renovado desta Copa, independentemente dos resultados que forem alcançados por sua Seleção. Os brasileiros estão fazendo novas e importantes interpretações dos seus modos de ser, pensar e agir. O povo brasileiro acordou e permanecerá em vigilância pelas práticas decentes que nos farão superar a endêmica corrupção que corrói a política brasileira. O Brasil aprendeu também que não pode criminalizar quem luta de forma pacífica por mais cidadania, democracia e direitos humanos no Brasil, a partir das ruas.

Se o Brasil redescobre o poder das ruas, redescobre também o poder que tem o esporte e o futebol. Redes sociais, ruas e futebol devem ser lugares democráticos para a gente avançar a partir dos ideais e das práticas democráticas da maioria dos brasileiros.

Viva o povo brasileiro e a sua fibra de seguir vencendo!

Educar é cuidar

[quote_box_right]“Deus é alegria. Uma criança é alegria. Deus e uma criança têm isso em comum: ambos sabem que o universo é uma caixa de brinquedos. Deus vê o mundo com os olhos de uma criança. Está sempre à procura de companheiros para brincar.” (Rubem Alves)[/quote_box_right]

As crianças, nos seus diferentes níveis, idades e particularidades, projetam nos adultos suas referências de vida. Os pais, mães, professores e professoras exercem papel fundamental na afirmação do mundo das crianças. Desta forma, ao afirmar o seu mundo de criança, consolidam também suas percepções do mundo adulto. As crianças também ensinam que a gente não deve esquecer o nosso mundo de criança.

Os professores e professoras já foram crianças e guardam na memória os cuidados e a atenção que lhes foram dispensados quando ainda pequenos. Por isso mesmo, exercem, pela educação, uma relação de confiança e trocas, que deve ser sempre pautada pela coerência, pelo compromisso e pelo exemplo. As crianças até perdoam erros por palavras, mas não erros por atitudes.

Os adultos não perdem seu mundo criança. Com o mesmo carinho e apreço que se referem às crianças, as autoridades da educação deveriam tratar os seus professores e professoras. Não para tratá-los como crianças, mas para fortalecer os esforços e a dedicação que estes exercem, cotidianamente, com todas as crianças.

Uma rede municipal de educação que declara como prioridade o cuidado com as crianças deveria fortalecer uma identidade maior em torno de suas escolas. O uniforme escolar dará uma identificação maior às crianças de uma mesma rede de ensino, o que não significa identidade. Mas o que dará a identidade para a nossa educação? O que poderia fortalecer ainda mais os laços e vínculos entre os pais, os alunos e os professores, em torno de uma rede municipal?

O cuidado com os professores e professoras é um dever das redes de ensino. O cuidado e o respeito às crianças é um compromisso de todos! Uma escola acolhedora, inclusiva e que promova os direitos das crianças é uma responsabilidade que os professores e professoras devem compartilhar com todas as autoridades e com as comunidades.

Educar é cuidar. Aprender é um direito! Cuidar das crianças é assumir compromissos com uma escola que seja lugar de vivência de direitos e lugar de significativas aprendizagens. A qualidade de ensino, nesta perspectiva, passa pela responsabilidade da gestão municipal. Esta qualidade deixa a desejar quando ainda há falta de professores e quando as crianças ainda não estão suficientemente acomodadas para brincar, aprender e ser feliz.

Democracia dos professores

[quote_box_right]”Os homens constroem paredes demais e pontes de menos.” (D. Pire)[/quote_box_right]

A escola pública e democrática, bem como as eleições que escolhem os representantes da categoria dos professores e professoras é hoje uma conquista institucionalizada, mas que, na prática, ainda está longe de ser realidade plenamente vivenciada nas escolas e nos sindicatos ou associações de professores. Embora os professores sejam as grandes referências para a cidadania e a luta por direitos para os seus alunos, nem sempre eles tem uma ação politizada eficiente quanto tratam de organizar os seus interesses e os interesses da educação.

A crítica maior que podemos fazer aos sindicatos de professores é que estes centraram sua atuação apenas nas reivindicações salariais, deixando de atuar de forma mais ampla na perspectiva da educação. Os sindicatos se transformaram em máquinas administrativas anti-governos, descuidando dos interesses mais imediatos e significativos da vida funcional dos professores e da educação, de maneira geral.

Não são mais os professores que debatem a educação. O descuido para com as questões mais amplas e mais complexas da educação gerou um grande vácuo, agora ocupado por outros especialistas, de outras áreas, como economistas, sociólogos, filósofos. É inegável que eles tenham algo a dizer sobre a educação, mas suas reflexões não refletem o cotidiano da complexidade do dia a dia da educação.

As escolas e as organizações sindicais são grandes laboratórios de exercício de poder. Cotidianamente, através das relações interpessoais, elas administram as suas tensões internas, fortemente influenciadas pelo poder externo (dos governos e da comunidade). E os professores, peças chave desta engrenagem, nem sempre são considerados em suas dimensões humanas e como sujeitos de sujeitos. Professores não são números. Professores são sujeitos, seres humanos, com suas opções pedagógicas e ideológicas. O exercício de seu ofício não lhes permite neutralidade, pois a educação é, por natureza, um ato político. Suas práticas pedagógicas resultam de suas trajetórias pessoais, de seus compromissos com o ser humano e de seus conhecimentos e aperfeiçoamento profissional.

Ao escolher os seus representantes sindicais, os professores deveriam escolher dentre aqueles que, além de competências técnicas e de organização sindical e política, sejam capazes de construir “mais pontes e menos paredes”. Que pensem o Sindicato ou a associação de professores como uma estratégia de valorizar seus professores, articulando-se com outras entidades a fins de promover mudanças substantivas na educação. Que utilizem o Sindicato para representar verdadeiramente os professores, não os interesses pessoais ou de partidos políticos. Que advoguem a causa da educação acima de qualquer outra causa ou interesse.

O exercício do poder democrático é um dever e um legado que os professores podem deixar para a sociedade como um todo; esta é sua contribuição para a consolidação da democracia no Brasil.

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