Do cansaço

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É preciso voltar a fazer uso do tempo para recuperar o lazer de qualidade e viver o ócio sem culpa. É necessário reservar tempo para a improdutividade, não é fazer pausas para armazenar energias para mais atividades, isto é, já pensando na tarefa do trabalho a ser realizada.

Há um sintoma que paira sobre grande parte das pessoas, que é a queixa de cansaço permanente. O que significa isso?

A resposta a esta pergunta está na revisão de como estamos vivendo na atualidade. Antes tivemos a sociedade da manufatura e de metas tangenciadas pela disciplina externa. Em certo sentido, está ocorrendo uma mudança da sociedade administrada para a sociedade de resultados. Isso atinge a nós todos, independente da função ou profissão.

A maioria das pessoas se torna empresárias de si mesmas, correndo o risco de se esgotar numa correria frenética em mil e uma atividades diárias. Isso é caminho aberto para depressão, para a tristeza e a doença característica do sec. XXI, o burnout que se torna a cada dia a marca do nosso tempo.

Estamos numa época em que não há mais o operário/a revolucionário/a reivindicador, mas pessoas fracassadas, deprimidas e sem ânimo para luta, porque se sente envergonhado pelo seu “não sucesso” de ser empreendedor de si mesmo. Na verdade, existe uma penalização interna do próprio indivíduo quando fracassa no empreendimento de si mesmo. Esses processos de mudanças, isto é, com o surgimento das novas tecnologias produz nas pessoas a aceleração do tempo, levando-as à uma fadiga incomensurável.

E o notável é que as pessoas se sentem culpadas pelo próprio cansaço, porque ficam com a sensação de um cansaço “sem terem feito nada”, apesar de estarem aceleradas 24 horas.

Essa sociedade do desempenho e das metas é caracterizada pelo excesso de positividade, onde tudo é possível, mas o sujeito operador se sente exausto. Assim, aceleração do tempo acarreta as doenças neuronais e de difícil diagnóstico. Isso, acarreta à pessoa impotência e pouca abertura para buscar ajuda do outro.

A afirmação de si mesmo coloca o outro em eclipse. É preciso fazer uso do tempo para recuperar o lazer de qualidade e viver o ócio sem culpa. É necessário reservar tempo para a improdutividade, não é fazer pausas para armazenar energias para mais atividades, isto é, já pensando na tarefa do trabalho a ser realizado.

A aceleração atual está diminuindo a capacidade do encontro gratuito. Precisamos de um tempo de festa, do kairós e do tempo místico. Mas não significa “reza nos lábios e trabalho nas mãos”.

Precisamos do tempo para nós, porque a maior de nossas atividades é só tempo gasto e não é tempo para nós.

O “tempo perdido” é o tempo não recuperado, que resulta em neuroses e angústias. Urge criar nas Igrejas, nas famílias, nas escolas, nos clubes e serviços, o sentimento altruísta para fazer frente aos medos, as frustrações que se encontram em atualização constante.

Em “Viver em paz com as árvores: por que as árvores incomodam?”, escrevemos:

 “temos direito de esperar o futuro para poder julgar, sabendo que estamos pondo em risco a vida dos nossos filhos e netos? O que iremos responder para eles, quando nos perguntarem por que não fizemos nada, apesar de termos sérias dúvidas quanto aos riscos, no presente? Como justificar a nossa violência contra as árvores?” Leia mais: https://www.neipies.com/viver-em-paz-com-as-arvores-por-que-as-arvores-incomodam/

Autor: José André da Costa, msf.

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