Reforçando papéis construídos socialmente,
lá na infância, fazemos com que os adultos naturalizem
que o trabalho doméstico e ensinamos que cuidar dos filhos
é uma função da mulher, que o homem deve ser agressivo,
correr de carro, demonstrar masculinidade portando armas…

 

Cresci ouvindo que menino brincava com menino e menina com menina.

Os meninos não podiam brincar de bonecas. As meninas não podiam ficar brincando na rua até tarde. As meninas brincavam de casinha e os meninos de astronauta. Menina fecha as pernas quando senta, menino levanta a saia da menina, é engraçadinho: já é um garanhão. A menina que “deixou” levantarem sua saia é castigada e não pode usar mais saia, não sabe se comportar usando uma.

Já experimentou ver a diferença, numa loja de brinquedos, das coisas de menino e das coisas de menina? Para as meninas você vê todo o tipo de vassourinha, cozinha, chapinha e secador de cabelo, além do bebê, é claro, para já ir brincando de mamãe ou ainda ser princesa e esperar o príncipe chegar para que tudo se resolva.

Existe brinquedo de menino e brinquedo de menina? A expectativa dos adultos sobre os papeis de meninos e meninas muitas vezes impedem que as crianças brinquem do que querem. Será que isso é certo? Como abordar esse assunto com as crianças?

Para os meninos tudo que a imaginação permitir. Tem arco e flecha para os mais aventureiros, todo tipo de carro, armas e eles podem super-heróis, cowboys, cientistas e outras coisas legais com brinquedos que vão além da reprodução dos cuidados com a casa, com filhos ou cuidados com a própria beleza e aparência de acordo com padrões já pré-estabelecidos.

Na hora de brincar as profissões para os meninos são engenheiro, astronauta, bombeiro. As meninas professoras, enfermeiras, psicólogas. O contrário, nunca.

“Nossa que exagero, são só brincadeiras. São só crianças.”

Exatamente.

E por isso todos deveriam poder brincar tranquilamente com todos os brinquedos ao invés de reforçar papéis que, depois de adultos, devem assumir para manter o sistema que está posto.

É reforçando estes papéis construídos socialmente, lá na infância, que fizemos com que os adultos naturalizem que o trabalho doméstico e cuidar dos filhos é uma função da mulher, que o homem deve ser agressivo, correr de carro, demonstrar masculinidade portando armas…

Brincar é coisa séria! As brincadeiras consistem numa representação e experimentação da vida adulta e no momento que limitamos a criança a determinados brinquedos fazendo diferenciação de acordo com seu gênero, nas entrelinhas estamos limitando suas perspectivas de futuro em carreiras pré-estabelecidas e minando talentos que fogem do padrão “de menino” e “de menina”.

Então essas crianças crescem acreditando que as suas escolhas são determinadas por serem mulher ou homem e isso é imutável.

Isso, meus amigos, é desigualdade de gênero.

Desde cedo, meninos e meninas aprendem o que podem e o que não podem fazer. Eles são levados a acreditar que as suas escolhas são determinadas pelo sexo. Só que isso tem consequências sérias para as mulheres, que se tornam vítimas da desigualdade.

 As mulheres são mais de 50% da população do Brasil e nem metade das mulheres jovens tem carteira assinada enquanto 65% dos homens jovens estão empregados. Somente 30% dos jovens brancos e 40% dos jovens negros fazem atividades domésticas, enquanto que para as meninas o percentual é de 78% das jovens brancas e 86% das jovens negras.

Menino brincando de boneca não é problema, é solução! Quem sabe assim teremos uma geração de pais que realmente sejam pais e entendam que eles devem ao filho e à companheira mais do que “ajudar”. Menina brincando de luta não é problema, é solução! Quem sabe assim incentivamos mais mulheres a serem atletas no Brasil, assim como a ocuparem espaços predominantemente masculinos.

O gênero é a identidade do que é considerado feminino ou masculino. Não é universal, é construído socialmente e pode variar ao longo do tempo. Ora, se pode transmutar, porque não o fazê-lo para melhor?

Porque não incentivar meninos e meninas serem o que quiserem ser, a explorarem o seu potencial independente dos papéis que nos foram impostos até agora e serem respeitados por isso?

Que diferença faz na sua vida continuarmos reforçando lugares na sociedade usando o gênero como critério de diferenciação? Quando entenderemos que o ser-humano é muito mais do que o que se diz que ele deve fazer de acordo com as suas genitais?

Somos mais que isso.

E se você se sente bem com os papéis colocados, pense que do outro lado tem alguém sofrendo com essas imposições.

Somos seres dotados da capacidade de mudar o mundo para melhor, é só querer.

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