Ciência e Desenvolvimento

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Desenvolvimento talvez seja uma das palavras que mais vem na nossa mente quando pensamos em progresso, em crescimento econômico ou em inovação científica e tecnológica.

Em tempos de pandemia, vivenciados recentemente, todos os países estiveram empenhados em desenvolver uma vacina que pudesse pôr fim a esse terrível pesadelo que se abateu sobre o planeta. No entanto, é necessário problematizar o próprio conceito de desenvolvimento, seus pressupostos, suas finalidades, seus efeitos colaterais.

Em seu livro Ciência e Desenvolvimento, o epistemólogo argentino naturalizado canadense Mario Bunge desenvolve um conjunto de ensaios sobre o assunto que nos fazem pensar e nos instigam a sermos mais cautelosos e prudentes para não abraçar qualquer concepção de desenvolvimento sem avaliar as consequências de seus desdobramentos. Em um dos seus ensaios Bunge fala de quatro aspectos do desenvolvimento e como todos eles podem se tornar limitados quando pensados isoladamente. Trata-se do aspecto biológico, econômico, político e cultural.

Vejamos brevemente cada um deles seguindo os passos do próprio Mário Bunge.

A concepção biológica de desenvolvimento defende que ele ocorrerá se houver um aumento do bem-estar das pessoas, uma melhora da saúde de todos decorrente da melhoria da nutrição, da moradia, da vestimenta, dos hábitos alimentares, na prevenção das doenças etc. Certamente é a concepção de desenvolvimento preferida dos médicos higienistas e de todos aqueles que acreditam de que o país será desenvolvido quando todos os recursos forem canalizados para a saúde.

Por mais louvável que seja, pode se tornar uma concepção utópica e irrealizável porque não se preocupa com os meios necessários para alcançar o desenvolvimento biológico.

A desnutrição crônica, por exemplo que afeta de forma agressiva um país como o Brasil, dificilmente será superada se não houver uma mudança de mentalidade sobre o problema das desigualdades sociais, na injusta distribuição de renda, da forma como os governantes conduzem suas políticas e da falta de conhecimento das pessoas que se alimentam mal e desperdiçam dinheiro consumido alimentos de baixo teor nutritivo ou alimentando a indústria de bebidas alcoólicas.

Não se corrige o subdesenvolvimento biológico com medidas puramente sanitárias, tais como aumentar o número de médicos, de hospitais ou de campanhas de vacinação sem levar em conta outros fatores de desenvolvimento.

O desenvolvimento econômico defende que uma nação será desenvolvida se tiver uma forte indústria, o aumento das exportações e um elevando Produto Interno Bruto (PIB). Essa é a concepção preferida de empresários, economistas medíocres e políticos adeptos do desenvolvimentismo. É enganosa, pois pode produzir ainda mais a desigualdade social, o aumento da miséria, da violência e da competição destrutiva entre as pessoas.

A economia que deveria ser compreendida como meio para as condições de qualidade de vida das pessoas de um país se torna fim em si mesma e passa a beneficiar um grupo limitado de pessoas que se apossam das riquezas, do poder e da cultura em detrimento da grande maioria que é jogada na marginalidade e na pobreza.

A concepção política de desenvolvimento defende de que ele acontece quando ocorre uma expansão da liberdade, o aumento e segurança dos direitos humanos e políticos. É a concepção predileta dos políticos liberais. Também é limitada, pois de nada adianta ter os direitos políticos se faltam os meios econômicos e culturais para exercê-los. Não se tem democracia real quando em eleições os eleitores vendem seu voto para políticos corruptos que nunca entenderam o que é política no sentido profundo do termo.

A concepção de desenvolvimento cultural defende que este acontece quando ocorre um enriquecimento da cultura e à difusão da educação. Esta é a posição predileta dos intelectuais e dos educadores. Ela também não é suficiente, pois um estudante mal alimentado e contaminado por certas ideologias que desprezam a cultura letrada dificilmente aprende; um desempregado dificilmente se interessa por conhecimento ou por cultura, pois lhe falta condições básicas de vida. O desenvolvimento cultural não se realiza se não estiver acompanhado de um desenvolvimento biológico, econômico e político.

Por fim, talvez deveríamos investir na ideia de um desenvolvimento integral que olhasse para as quatro concepções com a mesma atenção e com os mesmos investimentos.

Uma nação será desenvolvida quando as quatro dimensões forem igualmente contempladas. E todas elas tem por base uma educação para todos, com escolas públicas de qualidade, professores bem formados e bem remunerados e um projeto de nação que prioriza vida digna para todos, com justiça social e equidade.

Para muitos, isso não passa de uma utopia ou uma ilusão irrealizável; para outros um projeto possível que se concretiza quando somos capazes de pensar a sociedade de forma coletiva que coloca as pessoas e o meio ambiente como centro das atenções. A isso poderíamos dar o nome de DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.

Autor: Dr. Altair Alberto Fávero

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