A riqueza de poucos beneficia a todos nós?

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Resta saber como essa riqueza é produzida, como ela é administrada, nas mãos de quem ela está, a serviço de quê e de quem ela é utilizada, e principalmente, como ela é utilizada nas relações sociais que compõem uma sociedade.

A riqueza em todos os tempos foi alvo de uma das mais cobiçadas ambições humanas e responsável pelas piores e mais sangrentas catástrofes. De fato, por um olhar retrospectivo dos primórdios da humanidade e até os dias atuais, percebe-se que a busca pela riqueza mobilizou os homens primitivos para os conflitos entre clãs, o domínio de técnicas, o desenvolvimento de ferramentas, o conhecimento, a violência, a corrupção, a mentira, a degradação da natureza, o desenvolvimento do pensamento, as grandes navegações, as guerras, a espionagem, a manipulação das opiniões … e a lista poderia ser imensa.

A riqueza foi materializada de diversas formas: ouro, prata, propriedades, patrimônio, dinheiro, obras de arte, ostentação, poder, produção, patentes, cultura, educação, conhecimento, desenvolvimento de tecnologias, domínio da informação.

Não há dúvidas de que a grandeza de um país passa pelo grau de riqueza que ele possui.

Resta saber como essa riqueza é produzida, como ela é administrada, nas mãos de quem ela está, a serviço de quê e de quem ela é utilizada, e principalmente, como ela é utilizada nas relações sociais que compõem uma sociedade. Em outras palavras, um país pode ser detentor de uma imensa riqueza de produção, de recursos naturais, de capital, de indústrias e ter uma imensa pobreza populacional, sofrer imensos problemas decorrentes dessa pobreza e ser avaliado internacionalmente como um país pobre, subdesenvolvido, atrasado.

Talvez uma das falácias mais perversas que historicamente foi instituída é a de que “a riqueza de poucos beneficia a todos”.

A história perpetuou essa falácia e ela continua sendo compartilhada em nossos dias por governantes, economistas e formadores de opinião; e assimilada pela população iludida pelo fundamentalismo religiosos e pelo populismo político. É essa falácia que produz cada vez mais a desigualdade social, o aumento da pobreza e todos os males que ela representa.

O sociólogo Zygmunt Bauman num livro que tem o mesmo título deste escrito, baseado num estudo do Instituto Mundial para a pesquisa do desenvolvimento Econômico da Universidade das Nações Unidas, relata: “1% dos adultos mais ricos possuía 40% dos bens globais em 2000, e os 10% mais ricos respondiam por 85% do total da riqueza do mundo. De outra parte, 50% da população mundial adulta tem de sobreviver com 1% da riqueza.

Nos últimos 20 anos, essa desigualdade só aumentou, principalmente em países como o Brasil e em países subdesenvolvidos, com seus governos autoritários que representam ideologicamente as elites da riqueza e que adotaram o receituário neoliberal para conduzir as reformas econômicas e destruir os direitos sociais.

A competição tem sido um dos preceitos do receituário neoliberal amplamente aceito no senso comum e lamentavelmente incorporado nas narrativas empresariais da educação. Seguindo esse preceito, os processos educativos ao invés de se tornarem um tempo e um espaço produtivo de cooperação e formação humana, estão se tornando um coliseu de luta entre estudantes, professores, áreas do conhecimento e narrativas entre o que é relevante ou irrelevante.

Como bem ressaltou o escritor sul-africano John Maxwell Coetzee (Nobel em Literatura em 2003),

“é forçada a afirmação de que nosso mundo deve ser dividido em entidades econômicas competitivas porque isso é o que sua natureza exige. Economias competitivas surgiram porque nós decidimos dar a elas essa configuração. A competição é um exercício sublimado, voltado para a guerra. A guerra não é um caminho inevitável. Se quisermos guerra, devemos escolher a guerra, mas se quisermos a paz, podemos igualmente escolher a paz. Se desejamos rivalidade, podemos escolher rivalidade. Não obstante, em vez disso, podemos decidir pela cooperação amigável”.

Certamente, palavras sábias e dignas de uma profunda reflexão para pensarmos o futuro da humanidade: que tipo de sociedade queremos deixar para as futuras gerações? Um país marcado pelo ódio, competição, ganância, prepotência de uma elite concentradora de riqueza que destrói os recursos naturais e o meio ambiente, que humilha os pobres, que instrumentaliza a política, o Estado e a própria educação? Ou uma sociedade solidária, pautada pelos princípios da cooperação, da justiça social, do respeito à dignidade humana e o meio ambiente?

Autor: Dr. Altair Alberto Fávero

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