Uma cidade Encantadora!?

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Há lugares do mundo onde tudo simplesmente nasce. De um dia para outro, surgem eventos, iniciativas, anúncios e ideias encantadoras. Ninguém viu antes e ninguém entende o porquê de tanta explosão de coisas que parecem ter o propósito de envolver os habitantes numa redoma que brilha, que encanta e que desperta os mais nobres sentimentos de felicidade. Uma cidade assim dura para sempre?

Uma cidade linda? Tudo nela brilha, tudo é tomado de cores, cheiros e sabores. A cidade tem luzes e alegrias para todos. Lá os bebês são tesouros. Há farmácias em todas as esquinas. Lá a educação transforma o mundo e se anuncia referência nacional. Obras e inovações não param de ser anunciadas! Como fogo de palha, tudo o que aparece, logo some deixando vácuos, os quais chamam mais novidades e mais eventos. Qualquer similaridade com a natureza dos foguetes é mera coincidência. Os foguetes não têm marcha a ré e sempre andam rápidos, para frente.

Uma cidade encantadora não é maravilhosa? Ninguém está triste e nem doente. Ninguém reclama mais saúde, educação, segurança e moradia. Todos os problemas de ontem parecem estar resolvidos hoje ou, no máximo, amanhã.

Porém, nem sempre foi assim. Passaram-se mais de 150 anos para esta cidade despertar!

Cidade encantadora agora possui líderes que brilham e falam maravilhas. Possuem boa oratória, tanto que a mídia gosta deles. Conseguem convencer, encantar, promover maravilhas, mesmo que rápidas e passageiras.

A cidade encantadora constrói shoppings e instala muitas farmácias. Abre cursos de medicina, entretanto, fecha livrarias, bares, cafés e cinemas.

A cidade encantadora não tem calçadão para sua gente descansar enquanto toma um café e curte uma boa música. Há poucos lugares para seus habitantes caminharem, andarem de bicicleta, fazerem piqueniques, admirarem a natureza e o murmúrio dos pássaros.

Por incrível que pareça, ciclistas e pedestres desta cidade já descobriram a maravilha de caminharem e andarem por ruas e passarelas. Contudo, o espaço para estes fins precisa ser compartilhado por ambos, mas as dimensões do mesmo nem sempre permitem uma boa convivência.

Nesta cidade encantadora realizam-se eventos culturais de literatura, folclore e shows musicais. Tudo o que é feito é para reforçar encantamento, mas não o pertencimento.

A cidade é apenas encantadora, mas muitos a pretendem mais cosmopolita. Com astúcia e sutileza, outros tentam disfarçar o jeito provinciano desta cidade ser.

Magias são criadas e impulsionadas pelo glamour do marketing: sempre lindas, coloridas, sofisticadas, mágicas. Este vende mundos que contrastam com a dureza e as lutas cotidianas das pessoas que escolheram esta cidade para viver e morar.

A magia rege um espetáculo de uma vida irreal. Tudo o que é anunciado na cidade fica como se já estivesse feito há muito tempo. Nela, os verdadeiros artistas do espetáculo cotidiano de vida e de trabalho tornaram-se sujeitos passivos e coadjuvantes.

Vamos embora, minha gente, porque a cidade precisa de espetáculos! Neste contexto singular de uma cidade encantadora, os problemas da vida real são manipulados, maquiados e esquecidos. É duro demais acordar, todas as manhãs, sem poções mágicas! Viva os espetáculos! A vida, que espere um pouco mais!

Legal mesmo é que ainda existem pessoas desta cidade que acreditam nos potenciais e na consistência de coisas que possam gerar realidades mais duradouras, mais perenes e mais eficazes. Que acreditam que mudanças verdadeiras exigem mais processos, mais participação, mais envolvimento e pertencimento; e menos eventos passageiros.

O tão propalado encantamento nesta cidade agora sugere que alguns poucos, representando os demais, façam pontes aéreas para conhecer cidades que tenham vocação de “Educadoras”. Para além do encanto, talvez por aqui não existam significativas coisas que mereçam ser conhecidas e reconhecidas. Ou, talvez, muito do que aqui existe, atrapalhe o próprio encantamento propalado.

Enfim, dúvidas pairam na cidade encantadora: até quando os habitantes dela suportarão as ilusões, os espetáculos, as magias e os encantos que não consideram a vida como ela é? Quando esta cidade olhará para si mesma e promoverá o pertencimento, reconhecendo e promovendo os potenciais desta gente que a escolheu como um bom lugar para conviver e ser feliz?

Autor: Nei Alberto Pies

1 COMENTÁRIO

  1. Parabéns Nei pelas sábias colocações. Muita mídia e pouco reconhecimento do professor, daquele faz a educação acontecer no nosso município. O verdadeiro sentido de cidade educadora é muito mais amplo e abrangente.

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