Matam a educação, aos poucos!

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Matam a educação no Brasil
desqualificando professores e professoras,
que agora são declarados,
junto com a classe artística,
inimigos da nação.

Faz tempo que estão matando a educação brasileira. Faz tempo que não cuidam da escola pública, para que ela possa prover uma educação de qualidade. É fato, só cego que não queira ver. E chegamos ao pior: bem recentemente, escolheram artistas e professores como os inimigos da nação.

Vejam que, em recente visita ao Brasil, Vikas Pota, CEO da Varkey Foundation, instituição que organiza o Prêmio Melhor Professor do Mundo, se reuniu com educadores e representantes de ONGs e fundações da área. Em entrevista ao Estado, mostrou-se informado sobre as políticas do governo federal e criticou o ambiente educacional que coloca alunos e professores uns contra os outros. “Elegeram os professores como inimigos, eles que são, e deveriam ser reconhecidos, como os maiores aliados da melhora do ensino.”

Matam aos professores, aos poucos, como já afirmou meu colega de profissão Douglas Peretto: “Procura outra coisa pra fazer!”, exclamam. Claro, diante das baixas condições de infraestrutura, penúria salarial e da enorme responsabilidade em educar quem chega com fome/frio/agredido/a pé/etc, quem você acha que vai querer ser professor?”.

Como professor da rede pública municipal e estadual, sempre lutei para que a escola pública tenha qualidade social. Não a qualidade dos números ou das estatísticas frias, mas a satisfação que a escola pode produzir na medida em que é mediadora da convivência social e da construção do conhecimento.

Escolas públicas com qualidade social existem às pencas, mas não há reconhecimento. Reconhecer a qualidade e o sentido de pertencimento de todos com a escola somente em campanhas de TV em rede nacional. Parece perigoso reconhecer, verdadeiramente, o esforço fora do comum que muitos professores, professoras, estudantes e pais fazem por este Brasil afora para manter suas escolas de pé, com o mínimo de estrutura e decência.

As greves e paralisações dos professores Brasil afora revelam a luta pelo reconhecimento profissional que os mesmos foram perdendo ao longo das últimas décadas. Para os profissionais da educação, a educação não é um fim em si mesma, mas é meio para estimular e projetar no imaginário das crianças, dos jovens e dos adultos as condições subjetivas, materiais e sociais para que cada um conquiste sua vida e sua felicidade.

Professores reclamam condições materiais e subjetivas para que possam exercer função de alimentar esperanças para a superação da vida sofrida da maioria de seus estudantes e de toda comunidade onde atuam através da escola. Reclamam apoio para implantar propostas pedagógicas que considerem a organização dos sujeitos para a conquista dos direitos e construção de sua dignidade.

A pergunta é: a quem interessa manter a escola pública tão sufocada e tão maltratada?

Sempre é urgente e necessário perguntar o que é uma boa escola, uma escola com qualidade social. Responder o que é uma boa escola nos desafia a pensar as escolas que fazemos, cotidianamente, para torná-las cada dia melhores. Da mesma forma, o ser humano precisa responder o que é uma vida boa. Vida e escola se entrecruzam, cumprindo finalidades distintas e complementares na vida das pessoas.

O mais incrível é que quando a sociedade se mostra disposta a debater qualidade na educação, os professores/as são atacados e apontados como responsáveis pelo insucesso escolar. E o que é mais grave: as peculiaridades de seu ofício começam a ser entendidas como privilégios, não como direitos. Professores e artistas passam a ser tratados como inimigos da família e da sociedade.

O maior crime dos professores é lutar pela dignidade da sua profissão e pela qualidade da educação pública. O maior crime é que na escola pública, apesar de tudo, ainda há conhecimento de qualidade social. O maior crime é que professores, organizados através de seus sindicatos, ainda denunciam as mazelas da educação brasileira e exigem mudanças. O maior crime da educação brasileira é que ela ainda resiste, para dar aos brasileiros e brasileiras, as bases para sonhar com uma sociedade diferente.

Enquanto o Brasil considerar os investimentos na educação como gasto e não como investimento, continuaremos a ser uma nação pobre e medíocre. Um país, uma nação que não permite o desenvolvimento integral, crítico e soberano de seus cientistas, pesquisadores e pensadores está fadada ao fracasso cultural e econômico.

Educação pública é para “alguns especialistas de ocasião” um “fetiche socialista”. Vai discutir o que, num país que se permite uma aberração como esta: “…educação estatal não é e nem pode ser eficiente e, além disso, o acesso universal à educação garantido através do estado — e não o resultado de um mercado livre — é algo que vem com um custo altíssimo e indesejável, o qual é jogado nas costas de outros”.

É bravo quem luta quem luta pela educação como um direito de todos.

Sonho e luto muito para que a educação seja prioridade, que as escolas sejam de qualidade e que o trabalho dos educadores seja reconhecido por toda sociedade. Mas, cotidianamente, tenho que arregaçar as mangas, os meus pensamentos e as minhas forças criativas para realizar o melhor trabalho como professor, sem descuidar da minha responsabilidade de lutar por melhores condições de trabalho do professor e da aprendizagem dos educandos e educandas. E de me somar com as forças de toda comunidade escolar, sobretudo dos pais dos estudantes e das organizações vivas do entorno de nossas escolas para que nossa educação tenha como rumo a qualidade social.

Além de afirmar, resta perguntar: No Brasil que vivemos, que educação queremos e precisamos?

Coragem! Tempos difíceis tentam abater a educação integral, tão bravamente construída e alicerçada por pensantes mentes brilhantes como Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, Maria Nilde Mascellani, Florestan Fernandes, Miguel Arroyo, Jaqueline Moll e Paulo Freire, para citar alguns.

Como disse Sofia Cavedon, ao ser perguntada sobre os desafios da profissão docente, em entrevista a este site: Nosso desafio é sermos construtores de nossa valorização junto com a melhor educação para os filhos e filhas dos trabalhadores e trabalhadoras”.

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