Crianças que crescem próximas a áreas verdes são mais saudáveis e inteligentes

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As crianças aprendem com as árvores a serem vaidosas. Sim, porque as árvores gostam de se mostrarem bonitas e elegantes nos seus bailados de folhas ao vento, nos movimentos dos seus galhos, nas belezas dos seus frutos.

Estamos vivendo um tempo em que as áreas verdes estão ficando cada vez mais difíceis de serem encontradas nas cidades que se escondem através de muros de concretos. Nesses locais, encontrar uma árvore ou plantinha pelas ruas é uma raridade. Tudo é prédio e asfalto. O calor é enorme.

As crianças ficam sufocadas sem ter onde brincar e passam a maior parte do tempo dentro das suas casas. Nos escondemos atrás dos nossos muros e portões de grades com medo da violência que toma o país.

Nessas cidades de poucas áreas verdes, temos muita poluição. As fumaças das indústrias, a combustão dos automóveis sem contar com as poluições visuais e sonoras. Vivemos em um mundo louco. Ter um cantinho para sentar e respirar um ar limpo é difícil. Com isso, crianças vão crescendo em um mundo onde sem contato com a natureza o pensamento se detém a coisas que não ofertam o despertar de emoções capazes de auxiliarem no ensino-aprendizagem.

É sabido que as crianças que têm contato maior com a natureza, ou seja, que moram próximas de áreas verdes sentem-se mais livres, conseguem brincar mais, se divertem muito mais e com isso estão sempre preparadas para aprenderem as lições da escola porque seus espíritos esvaziados de tensões e perturbações alheias aos seus pequenos mundos conseguem acessar mais rapidamente o conhecimento escolar. Perturbações essas que chegam de diversas maneiras, tais quais o barulho das cidades, a falta de uma paisagem onde a criança possa imaginar outros mundos mais fascinantes, um ar poluído que prejudica a boa respiração e a preocupação constante com o tempo da família em relação ao seu tempo.

Não é à toa que nos contos de fadas encontramos sempre crianças em volta de áreas verdes. Morar perto de áreas verdes deixa as crianças mais ágeis e espertas porque elas aprendem a subir nas árvores, a comerem seus frutos que elas mesmas pegam com as mãos, a pularem de galhos em galhos brincando e mesmo se caírem de um deles vão rapidamente se limpar e voltar a brincadeira. Elas nunca se cansam de correr no meio das árvores e se jogarem no chão de areia ou de grama. Uma criança que se suja muito tem menos probabilidade de adoecer do que aquela criança que vive sempre limpinha e nunca brinca na areia ou toma banho de chuva. Toda criança tem que ter contato com a natureza.

A criança que vive perto de áreas verdes sabe o quão aquelas árvores são importantes para o seu bom viver criando um laço afetivo com elas que substitue muitas vezes um brinquedo de plástico.

O contato com a natureza proporciona um bem-estar enorme ao corpinho das crianças permitindo que elas estejam sempre bem diante de todos e de qualquer situação inesperada que venha a acontecer em suas vidas. Observando a forma como as plantas crescem, o curto período de vida de algumas flores, convivendo de perto com alguns insetos presentes nas plantas e ouvindo o canto dos pássaros essas crianças conseguem um equilíbrio emocional capaz de curar doenças e evitar traumas, pois a natureza oferece oportunidades de um viver em que a liberdade de poder ser o que quiser é possível.

No meio da pequena floresta a criança corre de encontro a árvore mais próxima. O seu sorriso é grandioso. Os braços abertos estão prontos para abraçar aquele tronco grosso. Não há nada melhor nessa vida do que abraçar uma árvore e sentir a sua grandiosidade. Para uma criança quanto maior a árvore maior parece ser a sua coragem de viver. E essa coragem é recebida de forma a fazer dela uma imitadora do ser árvore além da natureza, mas no seu mundo imaginário.

Se a árvore consegue ser grande e corajosa, a criança também poderá tornar-se forte diante dos obstáculos da vida. Se a árvore está sempre ali com as suas folhas e frutos apesar da chuva e do sol, apesar das noites escuras, a criança também saberá enfrentar as mais diversas adversidades porque se baseia naquele objeto da natureza que tanto ama.

O bom seria que toda criança tivesse uma amiga árvore assim como teve o nosso escritor pernambucano conhecido por Luis Jardim que teve como melhor amigo na infância o seu velho cajueiro. Aqui recomendo a leitura desse escritor maravilhoso que escreveu a sua autobiografia intitulada “Meu pequeno mundo”.

Na minha infância eu também tive uma árvore como amiga e também foi um velho cajueiro. A minha vó costumava dizer que as árvores guardam segredos e eu confiava muito no meu cajueiro contando-lhe os meus mais diversos problemas de criança incompreendida pelos adultos. A minha árvore morreu com todos os meus segredos dentro dela.

Eu não poderia deixar de falar do poeta da natureza brasileiro Manoel de Barros que tão bem trouxe as árvores e os bichos para a sua obra infantil.

Todos os seus poemas me encantam, mas tem um deles que acredito ser importante para este nosso ensaio intitulado “Árvore” que diz em seus versos “No estágio de ser árvore meu irmão aprendeu para santo mais do que os padres lhes ensinavam no internato. / Aprendeu com a natureza o perfume de Deus.” Vejam que metáfora bonita a de Manoel de Barros que nos traz um estágio de ser árvore que creio toda criança deveria exercitar. Esse perfume de Deus que pode entrar no corpinho e espírito da criança proporcionando-lhe coisas boas, bons sonhos, esperança, disposição para enfrentar os seus medos e aflições.

As crianças aprendem com as árvores a serem vaidosas. Sim, porque as árvores gostam de se mostrarem bonitas e elegantes nos seus bailados de folhas ao vento, nos movimentos dos seus galhos, nas belezas dos seus frutos. As crianças tendem a observar essas vaidades e querem imitá-las, de certa forma, e assim conseguem levar essa vaidade para a escola se esforçando para aprender as lições que lhes são ensinadas para conseguir êxito de aprovação. Toda criança vaidosa também desenvolve habilidades cognitivas possíveis de serem trabalhadas em sala de aula de uma forma que o raciocínio lógico possa ser explorado nos seus mais diversos aspectos.

Assim é que as crianças com problemas de deficiências mentais que convivem perto de áreas verdes recuperam-se mais rapidamente dos seus sofrimentos e conseguem apesar das deficiências alguns êxitos no ensino-aprendizagem seja talvez por observarem bastante o voo das borboletas frágeis pelas flores, seja por perceberem os beija-flores se alimentarem ou seja por estarem em contato com as joaninhas tão belas a povoarem os jardins. Esses insetos conseguem mostrar às crianças que apesar de serem frágeis diante dos humanos podem sobreviver num mundo difícil.

Quando as crianças entendem que na natureza existem os animais predadores e que se alimentam de outros animais elas percebem que precisam de autocuidados para escaparem das armadilhas que a vida lhes prega e dos predadores internos e externos que costumam aparecer nos seus pequenos mundos.

Esses predadores internos, dos quais falamos acima, para as crianças podem aparecer para as crianças no medo de fazer uma avaliação e tirar uma nota baixa, numa competição esportiva que corre o risco de não ser vitorioso, na disputa do amor dos pais com o irmão mais novo e tantos outros predadores que aparecem ao longo da infância da criança que costumam atormentá-la e se ela não tiver como exemplos essa natureza que tudo vence não conseguirá ser forte o suficiente para suportá-los permitindo assim adoecer emocionalmente e fisicamente.

O certo é, que mesmo as crianças que moram em edifícios cheios de grades e muros pudessem nos fins de semana estar perto da natureza. Seria muito bom para elas esse contato mesmo que por pouco tempo.

Já os predadores externos costumam ser identificados pelas incompreensões que os adultos tendem a apresentar aos pensamentos e indagações das crianças, ao seu jeito de ser e lidar com o mundo real, as suas emoções que muitas vezes são confundidas com birras e são largadas no meio do corredor de um shopping a chorarem os seus medos. Também são predadores externos todos aqueles que não conseguem cuidar das crianças com carinho e afeto, mostrando para elas respeito nos seus comportamentos e modos de falar e agir.

Cada criancinha é um mundo à parte desse mundo real e, muitas vezes, para algumas delas compreender esse mundo pode ser muito difícil sem o auxílio de um adulto que tenha por ela afeto e cuidado.

Assim é que na obra infantil “A árvore generosa” de Shel Silverstein a relação de amizade do menino para com a sua árvore que tudo lhe dar ocorre de uma forma sincera e afetuosa. A árvore ama tanto o menino que não mede esforços para satisfazer todos os seus pedidos assim como o menino também a ama por ser tão generosa para com ele. É dessa generosidade que as crianças precisam para crescerem felizes e emocionalmente fortes. Claro que não lhes daremos tudo o que pedirem, mas que possamos fazer por elas um pouco do que nos pedem como a simples atenção que muitas vezes esquecemos de dedicar-lhes no fim do dia ou na hora de ir para a cama.

O menino da “Árvore generosa” deitava-se à sua sombra e gostava de comer os seus frutos, ele sabia que nela podia confiar e assim as crianças aprendem a gostar da gente e a nos dar carinho quando descobrem que podem confiar em nós.

Nas minhas andanças pelo Brasil, já conheci meninos que moram perto de áreas verdes e meninos que moram em grandes condomínios cercados de muros e câmeras de segurança. Os dois meninos são felizes, cada um do seu jeito. Porém, os meninos das áreas verdes não têm medo de se pendurar numa árvore e sair de galho em galho caminhando sobre ela, de ficar conversando com a árvore por horas só para ver se ela lhe fala alguma coisa de volta.

São esses meninos das áreas verdes mais saudáveis e mais cheios de imaginação. Seus mundos são povoados por elementos da natureza e conseguem dormir bem e sonhar com coisas bonitas. Muitos meninos dos condomínios que conheci necessitam de profissionais da alma para cuidarem das suas emoções. Talvez o diferencial esteja na amizade sincera que as árvores oferecem e que essas crianças de condomínios não conseguem encontrar onde moram.

Sem contar que as brincadeiras ao ar livre, diante de uma floresta ajudam a gastar energia e a estimular os sentidos humanos. Toda criança gosta de correr e pular. Quando essa brincadeira é vivida com os familiares, se torna mais agradável ainda porque os seus laços se fortalecem. Correr com os amiguinhos também faz um bem maravilhoso porque as crianças fazem amizades. Brincar de esconde-esconde atrás das árvores ou em cima dos seus galhos é uma boa brincadeira.

A criança que mora perto de áreas verdes tem os seus sentidos mais aguçados porque escutam o canto dos pássaros, veem as belezas das flores, tocam nos galhos das árvores e sentem o cheiro do mato molhado pela chuva que é delicioso. Tudo isso proporciona à criança um bem-estar encantador.

A criança, depois de um dia de correria no meio da floresta, vai dormir cansada e consegue assim ter uma boa noite de sono. O bom sono faz com que a criança possa aprender as tarefas escolares de uma forma mais rápida, por isso é recomendável que as criancinhas estudem pela manhã quando os seus pensamentos estão livres e abertos a tudo o que lhe for agradável.

A criança que tem em casa um quintal para poder brincar também é mais feliz, pois pode jogar futebol ali mesmo sem ter que se deslocar para a quadra mais próxima, pode plantar uma árvore que goste e até mesmo ter a sua própria horta. Você já imaginou o quanto era bom na sua infância passear de bicicleta pelo seu bairro? Ou subir na árvore e ficar lá em cima chamando pelos seus pais? São coisas como essas que agradam as crianças.

Infelizmente, ter um quintal em casa é coisa difícil atualmente, porque a maioria das crianças mora em condomínios. Alguns pais tendem a se preocupar apenas com as doenças do corpo esquecendo das doenças da alma que as crianças apresentam e quando as levam a um profissional querem uma solução rápida aceitando qualquer tratamento até mesmo o uso de medicamentos quando o tratamento poderia ser efetuado com brincadeiras ao ar livre e próximas da natureza onde árvores e bichos tornam a vida da criança mais agradável.

Também temos as crianças que ficam trancadas nos seus quartos o dia inteiro plugadas em aparelhos eletrônicos e comendo enlatados e guloseimas. Essas crianças que não correm e não pulam são sedentárias e se cansam facilmente nas aulas de campo quando são exigidas a fazerem trilhas ou passeios que sobem e descem ladeiras. A obesidade infantil só cresce no mundo inteiro porque as crianças não estão mais correndo e brincando como deveriam, por isso é importante que elas tenham essa proximidade com as áreas verdes onde possam brincar na grama rolando seus corpinhos por ela, correndo entre as árvores, subindo e descendo os seus galhos.

A conexão com a natureza traz muitos benefícios à criança. Deixe que ela experimente essa conexão e possa compartilhar momentos divertidos ao seu lado. Leve sempre que puder a sua criança para brincar num parque se na sua casa não tem um quintal com plantas e jardins.

Para finalizar o texto, gostaria de deixar a indicação de leitura do livro de José Saramago intitulado “A maior flor do mundo” onde um menino é capaz de fazer uma flor dar sombra e o povo da sua aldeia diz que ele vai sair por aí capaz de fazer uma coisa muito maior do que o seu tamanho, do que todos os tamanhos.

Veja o vídeo A maior flor do mundo: https://youtu.be/tLjToQkTLks?t=29

Eis o que penso das crianças que brincam ao ar livre, diante da natureza, perto das árvores, são capazes de imitá-las e tentar ser bonitos e fortes iguais a elas capazes de criar raízes profundas que vão buscar felicidades em terras alheias, mas cheias de afeto. Para uma criancinha dar os primeiros passos com os pés descalços não tem coisa melhor, pois desde pequenina vai saber o quanto a terra é uma mãe que merece respeito e cuidados da sua parte.

Que toda criança possa desfrutar de uma área verde para poder brincar, correr, pular até se cansar. Esquecendo, assim, os seus medos e ansiedades diante dos problemas da vida moderna. E que todo ensino possa ser ministrado diante da natureza e não em salas de aulas fechadas e sem janelas.

Fiquemos com a bela música de Benito Di Paula intitulada “Amigo do sol, amigo da lua” que nos diz “Vem amigo, nadar nos rios / Vem amigo, plantar mais lírios /
No vale, no mato e no mundo / Vamos brincar”. Que todas as crianças possam convidar umas as outras para nadarem nos rios e plantar lírios onde tem concreto, pois no mundo do faz de conta nascem flores até mesmo nas cabeças mais confusas do homem moderno. Vamos brincar!

Autora: Rosângela Trajano

Edição: Alex Rosset

35 COMENTÁRIOS

  1. Danda, lembra da goiabeira que tinha lá em casa? André subia lá no alto pra pegar as goiabas. Saudades

  2. Rosângela, quando lhe conheci em 1999 na noite de autógrafos do seu primeiro livro que era de poemas para crianças, eu já sabia que você ia longe na escrita. Parabéns por estar sempre nos trazendo novos conhecimentos e por encher o mundo de belezuras!

  3. Bonito, tia Rosângela. Aqui na minha casa tem um pé de limão, mas não dar pra brincar nele. Eu gosto de brincar na grama com Biloca.

  4. Lindo texto, Rosângela. Eu e o seu irmão estamos conversando para Rafael sobre o nosso tempo de criança.

  5. Que lindo, Danda, viajei em sua inspiração! Tive o privilégio de viver o verde na infância, subir nas mangueiras para conseguir a fruta mais amarelinha e cheirosa… Uma pena as crianças de hoje perderem esses cenários inspiradores de arte e liberdade. Parabéns, querida! Sempre brilhante! 🎈🎈🎈🎈🎈🎈

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