Castração química não acabará com estupros

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Se os políticos querem mesmo acabar
com a cultura do estupro, deveriam estar
discutindo políticas públicas de prevenção
e combate à violência de gênero.


Surfando na onda de indignação gerada no país pelo episódio do estupro/gravidez da menina de 10 anos, o deputado Eduardo Bolsonaro, que assim como os demais membros de sua família, nunca esteve preocupado com a defesa dos direitos das mulheres, apresentou um projeto de lei que prevê a castração química como condição para a progressão de pena dos homens condenados por estupro. A castração química consiste em usar métodos hormonais para privar o paciente de impulsos sexuais.

Esse não é um debate novo. Volta e meia surge nas redes e é entendido por alguns como “a salvação para as mulheres” e como uma forma de garantir que estupros não mais aconteçam. Mas essa é uma alternativa muito pouco ou nada eficaz, que por certo não vai acabar com os casos de abuso sexual. 

Todo estupro é doloso. Em todo estupro, existe a intenção de cometer aquele crime, diz advogada, referindo-se sobre o julgamento de Mariana Ferrer, o que gerou revolta nas redes sociais após sentença inédita no Código Penal Brasileiro. Leia mais clicando aqui.

Quando tratamos desta “solução” para este problema estamos entendendo que o estupro não é nada mais do que um impulso descontrolado do homem por sexo, uma vontade incontrolável que só pode ser contida quimicamente. Mas na verdade não é bem assim. O estupro está ligado ao desejo de exercer poder sobre outra pessoa.

Estupro não é um impulso sexual. Estupro é uma ferramenta de controle dos corpos. É uma prática implicitamente aceita na sociedade, que estimula e institucionaliza a cultura do estupro sexualizando crianças, encontrando formas de culpar a vítima, sob os argumentos de que ela estava usando roupas curtas ou saiu em horários “inapropriados”, normalizando assédios, considerando as denúncias como “mimimi”.

Mas, principalmente, a castração química entende que o estupro está no pênis, o que absolutamente não é verdade. Isso é reconhecido inclusive pela lei brasileira, que diz com todas as letras que não é necessário haver penetração para a violência ser um estupro.

Há mulheres que são penetradas por objetos.

Há mulheres e crianças que são forçadas a tocar em partes do corpo de outras pessoas.

Há atos violentos que usam outras partes do corpo.

A imensa maioria dos casos de violência sexual contra crianças não deixa marca, pois não acontece com penetração. Meninas e meninos são forçados a ver, tocar ou a serem tocadas.

A castração química não irá impedir que esses casos deixem de ocorrer. A incapacidade de ter ereção ou até mesmo um menor desejo sexual não são a raiz deste tipo de violência. O que realmente causa o estupro é a ideia de superioridade masculina sobre toda e qualquer pessoa e a certeza de que essas valem menos e podem ser controladas.

Se os políticos querem mesmo acabar com a cultura do estupro, deveriam estar discutindo políticas públicas de prevenção e combate à violência de gênero, como a criação de mais delegacias especializadas no atendimento a mulheres vítimas de violência, educação sexual nas escolas para que crianças entendam desde pequenas o que é o assédio, de que maneira ocorre e o que se pode fazer quando esse crime é praticado.

Em reflexão “Estamos falando de estupro mas vocês estão ouvindo”? jornalista Ingra Costa e Silva escreve: “e isso acontece pelo simples fato de que os homens acreditam que podem fazer o que bem entenderem conosco. Quando falamos de estupro temos que ter claro que não estamos falando de sexo: estamos falando de poder. Estamos falando de violência”.
Leia mais clicando aqui.

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