No Brasil não basta um novo marco legal. Temos legislações educacionais avançadas que não são implementadas. É preciso fiscalização para que seja cumprido e punição exemplar para os infratores.
Após postergações e cobranças, o Ministério da Educação (MEC), finalmente, publicou três novos atos regulatórios sobre a oferta de educação a distância por Instituições de Ensino Superior (IES) em cursos de graduação. Os atos são: o Decreto nº 12.456 e as Portarias do MEC nº 378 e nº 381, todas publicadas dia 19 de maio de 2025.
Esta nova legislação altera o Decreto de nº 9.057/2017, publicado há oito atrás, conforme abordamos na época neste Jornal Extra Classe[1] e que caracterizamos como uma legislação irresponsável assinada pelo então Presidente Michel Temer e o Ministro da Educação José Mendonça Bezerra Filho.
Neste período de 2017-2015, o Brasil, sem experiência histórica e sem critérios acadêmicos, consolidou-se como o maior ofertante de EAD no mundo.
Nas últimas duas décadas, perpassando a fase da pandemia, as regulações por decretos presidenciais em cada ciclo de governos diferentes, foram usadas como “porteiras abertas” para uma expansão descontrolada da mercantilização da educação superior, do empresariamento do ensino, que, no presente momento, detém 80% das matrículas, comprometendo a qualidade da formação dos egressos, cujas consequências são ainda incalculáveis para o futuro destas gerações e do país.
As consequências do modelo e seus impactos na qualidade no ensino e aprendizagem geraram, na sociedade brasileira, um clamor e relativo consenso da necessidade de revogar a legislação de EAD vigente e estabelecer um novo marco regulatório e uma nova política para o ensino à distância no país. Obviamente, os representantes do capital e os mercadores da educação espernearam, até porque, as medidas tomadas irão afetar seus resultados financeiros, que sempre foram seu objetivo supremo.
Destaques da nova política de EAD:
– Os cursos de graduação poderão ter três formatos: Cursos Presenciais, Semi Presencial ou Cursos A Distância;
– Os processos de processos de ensino e aprendizagem poderão ser realizados por Atividade Presencial; Atividade Síncrona; Atividade Síncrona Mediada e Atividade Assíncrona;
– Obrigatoriedade de ensino exclusivamente presencial para os cursos de Medicina, Direito, Odontologia, Enfermagem e Psicologia;
– Os cursos de graduação presencial deverão ofertar, no mínimo, 70% (setenta por cento) de sua carga horária total por meio de atividades presenciais;
– Os cursos semipresenciais podem ser ofertados com pelo menos 30% (trinta porcento) de atividades presenciais e 20% (vinte porcento) de atividades presenciais ou síncronas mediadas, os cursos de bacharelado, licenciatura e tecnologia das seguintes áreas: Educação e Ciências Naturais, Matemática e Estatística;
– Os cursos de graduação a distância deverão ofertar, no mínimo: 10% da carga horária total do curso por meio de atividades presenciais e, 10% da carga horária total do curso em atividades presenciais ou síncronas mediadas;
– O credenciamento para a oferta de cursos de graduação nos formatos de sua oferta será realizado por meio de processo regulatório e precisa constar nos Planos de Desenvolvimento Institucional (PDIs);
– É obrigatória a utilização das terminologias presencial, semipresencial e a distância para identificar o formato de oferta dos cursos de graduação em contratos educacionais, regulamentos e atos normativos internos e nas páginas dos cursos nos sítios eletrônicos das Instituições de Educação Superior;
– O corpo docente das Instituições de Educação Superior (IES), que atue nas unidades curriculares ofertadas de forma parcial ou integral em educação a distância, será responsável pelo planejamento, pela efetivação, pelo acompanhamento e pela avaliação dos processos de ensino e aprendizagem;
– Este corpo docente poderá ser composto pelas seguintes categorias: coordenador de curso; professor regente e professor conteudista;
– O corpo docente poderá ser auxiliado por mediadores pedagógicos, com formação acadêmica compatível, que exercerão atividade educacional de mediação pedagógica em processos de ensino e aprendizagem;
– As Instituições de Educação Superior deverão aplicar avaliações de aprendizagem presenciais, em suas sedes, nos campi fora das sedes e nos Polos EaD, em todas as suas unidades curriculares ofertadas de forma parcial ou integral em educação a distância;
– Os estudantes que se matricularam nos cursos de que trata o caput, até a alteração do seu status para “em extinção”, terão direito à conclusão do curso no formato de oferta previsto no ato de matrícula;
– É responsabilidade da IES assegurar a continuidade da oferta do curso no formato EaD, até dois anos após o prazo de integralização, previsto no projeto pedagógico do curso, de forma a viabilizar a conclusão pelos estudantes matriculados.
Repercussões de entidades e especialistas
Para o Ministro da Educação Camilo Santana, a EAD ocupa uma posição central no sistema de educação superior no Brasil e merece uma atenção maior do poder público. “Acreditamos que a EAD pode proporcionar ao estudante uma experiência tão rica quanto a dos demais cursos, desde que haja um efetivo compromisso de todos com o processo de ensino e aprendizagem”, defende Santana.
“O foco é o estudante e a valorização dos professores: a garantia de infraestrutura nos polos, a qualificação do corpo docente, a valorização da interação e a mediação para uma formação rica e integral, independentemente da distância física”, afirma o ministro.
O Conselho Consultivo para o Aperfeiçoamento dos Processos de Regulação e Supervisão da Educação Superior (CC-Pares) composto por instituições públicas, comunitárias e privadas, da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), Associação Brasileira das Instituições Comunitárias de Educação Superior-ABRUC, Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB), da União Nacional dos Estudantes (UNE), entre outros, apoiaram o novo o novo marco regulatório.
Em seu Manifesto coletivo estas entidades educacionais expressam que a bandeira da regulamentação da educação privada foi um dos destaques da Conferência Nacional de Educação (CONAE) e está incorporada no documento aprovado por essa conferência. O Fórum Nacional de Educação (FNE), fortalecendo essa bandeira, aprovou a constituição de dois grupos de trabalho: um para a regulamentação da educação privada e outro para a Educação a Distância.
Nosso entendimento inicial, pois novos atos regulatórios do MEC e do CNE (Conselho Nacional de Educação) serão exarados na sequência, aponta que este novo decreto nº 12.456/2025 é um avanço necessário e importante se comparado com a regulação irresponsável de 2017. Esta nova regulação estabelece uma política de EAD equilibrada e comprometida com uma efetiva aprendizagem dos estudantes, reforçando o espaço e o papel do corpo docente, exigindo das IES maior responsabilidade e qualidade social do ensino superior.
Porém, há ainda espaço para avançar e aprimorar esta regulação nos próximos atos tanto do MEC e do CNE, especialmente no que tange aos processos avaliativos das IES, dos Cursos e dos Estudantes (ENADE). É preciso que estes processos avaliativos sejam, também, presenciais, mais rigorosos na busca de um desempenho melhor, proibindo a oferta de cursos com conceitos 01 e 02 identificados nestas avaliações de cada IES.
No Brasil não basta um novo marco legal. Temos legislações educacionais avançadas que não são implementadas. É preciso fiscalização para que seja cumprido e punição exemplar para os infratores.
O Art. 209 da Constituição Federal existe deste 1988 e estabelece que o ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:cumprimento das normas gerais da educação nacional e avaliação de qualidade pelo Poder Público. Educação e formação de qualidade são direitos dos brasileiros que não podem serem negligenciados por nenhuma esfera.
Autor: Gabriel Grabowski. Também escreveu e publicou no site “Novos e velhos desafios da educação em 2025”: www.neipies.com/novos-e-velhos-desafios-da-educacao-em-2025/
[1] https://www.extraclasse.org.br/opiniao/colunistas/2017/06/novo-decreto-de-ead-flexibilizacao-irresponsavel/
Edição: A. R.