O convívio com as crianças revela a simplicidade. Nossa esperança é que o futuro destes pequenos seja num mundo onde tenham direito à ternura e alegria, à saúde e escola, ao pão e à paz, ao sonho e beleza.

O dia nem bem amanhece e a trilha sonora já começa. O repertório se resume em quatro nomes, entre eles, o meu. Assim segue a cada hora. À tarde ou a noite, os pequenos curiosos me relembram a todo instante a forma como meus pais decidiram chamar-me.

Em dois meses, já é possível saber quem está lá a gritar com tanto ardor. A primeira impressão é que precisam de algo, mas depois não é difícil compreender para que vieram. Sua missão – daquelas que a gente assume sem nem bem saber – é reafirmar em mim minha identidade, aquilo que sou, que me forma e que me trouxe até aqui. O nome, o meu nome, em sua boca, ganha novo sentido.

Lembro, no tempo da catequese, ter aprendido que um dos mandamentos avisa para não falar o nome de Deus em vão. Se Ele gosta ou não que o chamem toda hora, para coisas importantes ou nem tanto, não sei.

“Na minha humanidade, aprendi que quando estas crianças chamam meu nome não existe acaso nem vazio.”

Em casa há pouco para fazer. Não há caixa de brinquedos, carrinhos, bonecas, vídeogames, televisão ou tecnologias. Brinquedo é aquilo que se acha na rua, se (re)constrói, se (re)cria. As crianças que vão à escola são poucas e as motivações para irem menores ainda.

“A falta de habilidade para o diálogo mora em nós, adultos: deixamos de saber lidar com a infância que sobrevive dentro de nós. Mais grave ainda: temos medo de revisitar essa criança que subsiste no nosso íntimo.” (Mia Couto)

 

Assista interpretação Contos de Mia Couto:

Encontrá-los no portão ou na rua diariamente é ter a oportunidade de, na simplicidade dos gestos e dos olhares, ajudá-los a descobrir uma nova realidade. Mais que isso, este encontro é também porta para o seu mundo. Lá se brinca de correr com pau e rodas, se constroi carrinhos com palhas de milho e papagaios com sacolas velhas.

Em Moçambique, os pequenos também são guardiões dos maiores tesouros. Tratam de perpetuar a cultura e a língua makua na graça da fertilidade de suas mamás.

As meninas não precisam crescer muito para já ajudar a manusear o pilão e buscar água para a casa. Os meninos, que também não tardam a ajudar suas mães, são também responsáveis por cuidar dos rebanhos – algumas vezes de gado, mas em sua maioria, de cabritos.

No convívio com as crianças se sente a vida pulsar intensa na simplicidade. Nossa esperança é que o futuro destes pequenos seja em um mundo onde tenham direito à ternura e  alegria, à saúde e escola, ao pão e  paz, ao sonho e beleza.

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